A cada dois dias tentarei colocar um texto novo, para manter o interesse dos meus leitores e também algumas fotos para exemplificar alguns textos. Obrigada pelo apoio.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Fernão Capelo Gaivota



    As gaivotas são aves marinhas que  apresentam estrutura social altamente desenvolvida e comportamentos complexos. São capazes de detectar as correntes térmicas que se formam acima do mar e de utilizá-las no voo. Usam o voo principalmente para encontrar alimento. Menos Fernão Capelo Gaivota.
       A história dessa gaivota está no livro "Fernão Capelo Gaivota", de Richard Bach. Uma  gaivota que foi banida do seu grupo por entender que voar era muito mais importante  que comer. Enquanto o bando de mil gaivotas mergulhava na água em busca de comida, Fernão treinava seus voos rasantes. Pairava no céu sozinho, longínquo, esfomeado, feliz, aprendendo. O seu tema era a velocidade. Batia as asas com força e lançava-se em vertiginosa descida em direção às ondas. Em seis segundos, estava a 120 km/h, velocidade que desequilibra a asa no arranque para a subida. Quando tentava subir outra vez, o corpo girava como um parafuso e ele acabava como uma massa de penas que se esmagava no mar. Tentou dar o mergulho a 600m de altura e estabeleceu um recorde  de velocidade para gaivotas. Mas no instante em que modificou o ângulo das asas, esmagou-se num mar duro como tijolo. Quando voltou a si, jurou que seria uma gaivota normal  e esqueceria aquela loucura do voo perfeito. Não haveria mais desafios nem fracassos. Se fosse destinado a voos rápidos, teria as asas curtas do falcão. Era isso, asas curtas! Tudo o precisava era fechar as asas o mais que pudesse e voar só com as pontas. Voltou a treinar e atingiu 320 km/h. A velocidade era poder, alegria e beleza pura. Sabia que qualquer falha o reduziria a fragmentos de gaivota. Fechou os olhos, passou pelas gaivotas  do Bando de Alimentação como uma bala, fez a curva, espetou o bico para cima e foi reduzindo até conseguir abrir as asas. Na sua mente latejava o triunfo. Partiu para um mergulho a 2400m e descobriu que se movesse mais de uma pena, era disparado em movimento giratório como uma bala de espingarda. E Fernão fez assim as primeiras acrobacias de uma gaivota viva. Quando se juntou ao bando, estava tonto, cansado e realizado.  Pensou que elas ficariam loucas de alegria, pois agora haveria uma razão para viver. Mas ele foi banido do bando  pela desastrada irresponsabilidade, por violar a tradição das gaivotas e por esquecer que as gaivotas estão no mundo para comer e se manterem vivas. Gritou para o bando : "quem é mais responsável do que uma gaivota que descobre um significado, um propósito mais elevado para a vida? Agora temos uma razão para aprender, para descobrir, para sermos livres!" Todas as gaivotas lhe deram as costas. A partir dai, viveu solitário e aprendendo cada vez mais. Foi levado para o paraíso por duas gaivotas brilhantes, onde fazia experimentos de aeronáutica avançada. Aprendeu com a gaivota mais velha, Chiang, a se transportar para qualquer lugar do mundo apenas com a força do pensamento. Ficou preparado para voar no além e conhecer o significado das palavras bondade e amor. Sentiu saudades do seu grupo na Terra  e  voltou  como uma  gaivota brilhante que voava sem mexer uma pena. Passou a treinar o Francisco Gaivota, que fora expulso do bando porque queria alcançar a perfeição no voo. Começaram com o voo planado.
       O livro é dedicado ao verdadeiro Fernão Capelo Gaivota que vive em cada um de nós. Porque, na verdade, todos nós procuramos a liberdade, a perfeição, o amor, a bondade e o paraíso. Alguns poucos encontram, muitos outros não.

terça-feira, 9 de julho de 2013

Esqueci

A pequenina e doce Mel


Certo dia, estava eu na esquina conversando com uma amiga. Aproximou-se um senhor baixinho e simpático, perguntando se sabíamos onde era uma flora ali perto. Veio de ônibus de um bairro distante e tinha esquecido o endereço, mas sabia que era por ali. Respondemos que devia estar enganado, não havia flora por perto. Ele foi pegar o ônibus de volta, lamentando o esquecimento.
Minha amiga comentou que também é muito esquecida. Naquela mesma semana, tinha ido visitar a irmã no hospital. Na saída, não encontrou seu carro. Procurou-o nas redondezas e concluiu que o tinham roubado, ou a SETRAN o tinha guinchado. Desconsolada, voltava a pé quando de repente, avistou seu carro, parado em uma rua onde nunca pensaria em procurá-lo. Ela o estacionou lá e esqueceu!
Contei então o meu caso da semana. Numa tarde, fui à padaria com a Mel, minha cachorrinha yorkshire, e amarrei-a na gradinha ao lado da padaria. Fiz as compras e voltei. As 20:30h, chamei a Mel para comer sua ração e ela não apareceu. De repente, como se um raio caísse na minha cabeça, lembrei-me: eu a esqueci amarrada na padaria! Sai esbaforida e não a encontrei, alguém a tinha levado! Perguntei na padaria e ninguém sabia de nada. Fiquei com sentimento de culpa (lógico), tristeza, remorso, desespero. Andei por vários quarteirões perguntando e colocando cartazes. Eu e o filho entramos no facebook e nos sites de associações protetoras de animais, mandamos a foto da Mel e pedido de ajuda (uma vez ela sumiu e foi encontrada assim). No dia seguinte, fui à padaria ver se havia notícias. Conversei com o dono, o Beto (nome fictício, para proteger o personagem) e ele contou-me que lá havia um sistema de câmeras. Fomos assistir ao vídeo e por sorte, a Mel estava em um lugar ótimo para ser filmada (ao menos isto, coitadinha). As 16:30h, lá estou eu no vídeo, com minha sacola de pano, amarrando a Mel. As 16:40, saio da padaria com a sacola cheia e passo direto pela Mel. A partir daí, ela deita, levanta, põe a língua pra fora, espreguiça, abana o rabinho, coça, late, coça novamente, tudo registrado minuto a minuto. Eu agoniada e o Beto falando o nome de todas as pessoas que entram na padaria. As 17:30, ela continua lá. As 17:50 também. As 18:00h ela já desapareceu! Ele então volta o filme devagar e ficamos assistindo como se fosse um filme policial, de mistério e suspense. Uma mulher magra, morena, passa pra lá e pra cá, conversa com a Mel, olha pros lados. Falamos: foi ela. Não foi. As 17:59 um homem alto, bem vestido, atravessa a rua, desata o nó e carrega a Mel para uma lojinha na frente da padaria. Alívio geral,  agora sabemos onde ela está. Fui à lojinha, expliquei o acontecido e pedi a Mel de volta. Ela voltou de banho tomado e numa alegria indescritível.
Até hoje sinto remorsos, mas fico feliz de não ter esquecido um neto (são nove pequeninos, a chance é grande). E me consolo ao pensar que isto não acontece só comigo. Ontem mesmo um senhor perguntou-me onde era a rua Alexandre Marques. Eu disse que esta eu não sabia, mas que a Eduardo Oliveira era a rua de trás. Ele falou que era essa mesmo, tinha esquecido o nome. E hoje leio no jornal que uma americana, Dori Rhoades, vendeu uma jaqueta usada e depois apareceu na TV, desesperada, pedindo para que o comprador entrasse em contato com ela. No bolso da jaqueta, por precaução, ela tinha guardado um par de brincos de brilhantes avaliados em 36 mil reais, e esqueceu! Meu Deus, onde vamos parar?


terça-feira, 14 de maio de 2013

Aventura na calçada

Mel na caixinha com o neto Théo

A netinha Maíra

      Uma simples ida à padaria pode representar uma aventura e tanto, depende do cenário e dos protagonistas. Por exemplo, de minha casa até à padaria, a distância é de um quarteirão e meio. Acompanhada pela netinha de dois anos, Maíra, e pela Mel, minha cachorrinha yorkshire, o trajeto leva cerca de meia hora e o pãozinho chega frio.  
      Isso porque existem vários empecilhos no caminho. Ao lado de casa tem um lote vago com calçada esburacada. Depois, uma casa grande abandonada, ocupando toda a esquina, com passeio de pedra portuguesa. O mato cresce nessas calçadas, viçoso e verdinho. Os formigueiros aproveitam e crescem também. A cachorrada da vizinhança faz cocô, de todo tamanho, cor, cheiro e consistência (os donos fingem que não vêm; o da Mel eu cato). Nesse cenário, a Maíra vai caminhando devagar, olha os buracos e fala “dado” (cuidado). Depois, sobe nas moitas de capim e fica pulando, deve pensar que é um tipo de cama elástica. Quando encontra um formigueiro, fala “miga, miga” (formiga), agacha e fica observando. Quem sabe vai ser bióloga, entomologista, e se dedicar a estudar o comportamento das formigas. Mas penso que não, pois logo sobe no formigueiro, pula várias vezes e, com instinto assassino, fala “matá, matá”. As formigas aproveitam, sobem pelas perninhas dela e tenho que agir rápido, antes que injetem ácido fórmico em sua tenra carninha e comece o berreiro. Na sequência, ela aponta com o dedinho os cocôs na calçada, falando “totô, totô”. Por enquanto, não pisou e nem pulou em nenhum. A situação é mais complicada quando ela vai à padaria empurrando o seu carrinho de bonecas cheio de ursinhos. As rodinhas emperram nos buracos, o carrinho tomba, os ursinhos caem e as lágrimas descem copiosas no rostinho angelical. Complica também quando ela cisma de segurar a Mel na coleira. Certa vez, vários cães se encontraram na esquina, as coleiras se enroscaram, laçaram as perninhas da Maíra e ela caiu sentada, indignada e raivosa.
      Mas, ao lado de todas as confusões, há fatos interessantes. Um vizinho, cansado de pisar em cocô de cachorro, pregou no portão da sua casa o cartaz: “O dono tem na cabeça aquilo que seu cão faz na calçada”. A esposa comentou que “o dono” poderia estar se referindo ao dono da casa. Ele retirou o cartaz do portão e colocou no poste, está lá.
Felizmente, há pessoas civilizadas que recolhem os dejetos do cão. O meu neto, Pedro, é um bom exemplo. Sempre que saia para passear com o Roque, um cachorro perdigueiro que o arrastava pelas calçadas, levava saquinhos de plástico e catava tudo. Um dia, voltou apressado, com o rosto vermelho e suado, deixou o Roque no apartamento e saiu novamente. A mãe perguntou onde ia e ele respondeu: “faltou um saquinho”.
Não posso deixar de comparar as calçadas daqui com as de Sacramento, Califórnia, onde minha filha mora. São todas padronizadas, com rampas de acesso em toda extensão. Lisinhas e limpinhas. Lá, o meu netinho Enzo sobe na sua genial bicicletinha de madeira, sem pedal, e vai empurrando velozmente com as perninhas, sem perigo de cair.
Também não posso deixar de pensar nos cadeirantes. Em um artigo na Folha, Andrea Matarazzo chama atenção para o fato de que em São Paulo existem mais de 1,5 milhão de pessoas com deficiência. Afirma que elas não são encontradas nas ruas, certamente pela impossibilidade de circular nas calçadas. Muito triste.
Bem, de qualquer forma, continuarei indo à padaria, não fico sem pãozinho. 

sábado, 11 de maio de 2013

Mãe

Minha filha Karine com seu filho Yuri

Minha filha Thaís com os filhos Enzo e Lia

O texto abaixo não é meu, encontrei-o na internet, de autoria desconhecida. Gostei tanto dele que resolvi compartilhá-lo com os leitores, como um presente para o dia das mães.
   “Mãe é aquele ser estranho, louco, capaz de heroísmos, dramas e breguices com a mesma fúria; escreve carta para o Papai Noel, se faz passar por fadinha do dente, coelho da páscoa, cuca, pede autógrafo para artistas deploráveis, assiste a programas, peças, shows horríveis, revê milhares de vezes os mesmos desenhos animados, conta as mesmas histórias centenas de vezes, vai pra Disney e ADORA!
    Mãe faz escândalo, tira satisfação com professor, berra em público, dá vexame, deixa a gente sem graça, compra briga; é espaçosa, barulhenta, tendenciosa, leoa, tiete, dona da gente. Mãe desperta extremos, ganas, irrita, enlouquece, mas... É mãe.
    Mãe faz promessa, prestação, hora extra, pra que a gente tenha o que é preciso e o que sonha. Mãe surta, passa dos limites, às vezes até bate, diz coisas duras; mãe pede desculpas, mortificada... Mãe é um bicho doido, louco pela cria. Mãe é visceral!
    Mãe chora em apresentação de balé, em competição de natação, quando a filha menstrua pela primeira vez, quando dá o primeiro beijo. Xinga todo e cada desgraçado que faz a filha sofrer, enlouquece esperando ela chegar da balada, arranca os cabelos diante da morte...
    Mãe é uma espécie esquisita que se alterna entre fada e bruxa com uma naturalidade espantosa. É competente no item culpa e insuperável no item ternura, mas pode ser virulenta, tem um lado B às vezes C, D, E... Mãe é melosa, excessiva, obsessiva, repulsiva, comovente, histérica, mas não se é feliz sem uma. Mãe é contrato: irrevogável, vitalício,intransferível.
    Mãe lê pensamento, tem premonição, sonhos estranhos. Conhece cara de choro, de gripe, de medo; implica com amigos, namorados, escolhas. Mãe dá a roupa do corpo, tempo, dinheiro, conselho, cuidado, proteção.
   Mãe dá um jeito, dá nó, dá bronca, dá força. Mãe cura cólica, porre, tristeza, pânico noturno, medos. Espanta monstros, pesadelos, bactérias, mosquitos, perigos. Mãe tem intuição e é messiânica: mãe salva. Mãe guarda tesouros, conta histórias e tece lembranças. Mãe é arquivo!
    Mãe exagera, exaure, extrapola. Mãe transborda, inunda, transcende. Ama, desmama, desarma, denota, manda, desmanda, desanda, demanda. Rumina o passado, remói dores, dá o troco, adora uma cobrança e um perdão lacrimoso.
    Mãe abriga, afaga, alisa, lambe, conhece as batidas do nosso coração, o toque dos nossos dedos, as cores do nosso olhar e ouve música quando a gente ri. Mãe tem coração de mãe!
    Mãe é pedra no caminho, é rumo; é pedra no sapato, é rocha; é drama mexicano, tragédia grega e comédia italiana; é o maior dos clássicos; é colo, cadeira de balanço e divã de terapeuta... Mãe é madona-mia! É deus-me-acuda; é graças-a-deus; é mãezinha-do-céu, é a-mãe-é-minha-e-eu-mato-quando-quiser; é a que padece no paraíso enquanto nos inferniza...
    Mãe é absurda e inexoravelmente para sempre e é uma só: não há mistério maior! Só cabe uma mãe na vida de um filho e olhe lá! Às vezes, nem cabe inteira. Mãe é imensurável!
   Mãe é saudade instalada desde o instante em que descobrimos a morte. Mãe é eterna, não morre jamais. Bicho estranho, entranha, milagre, façanha, matriz, alma, carne viva, laço de sangue, flor da pele.  Mãe é mãe, e faz cada coisa..."
    Parabéns a todas as mães pelo seu dia!!!

terça-feira, 9 de abril de 2013

Pôr do Sol


Casapueblo em Punta del Este, Uruguai

          No livro “O Pequeno Príncipe”, o principezinho morava em um planeta bem pequeno. A sua vidinha era melancólica e por muito tempo sua única distração era a doçura do pôr do sol. Podia contemplar o espetáculo várias vezes por dia, bastava afastar sua cadeira para pontos diferentes do planeta. Em certo trecho, ele comenta com seu amigo aviador:-“Um dia eu vi o sol se pôr quarenta e três vezes!” E um pouco mais tarde, acrescentou: -“Quando a gente está triste demais, gosta do pôr do sol...”O aviador perguntou:-“Estavas tão triste assim no dia dos quarenta e três?” Mas o principezinho não respondeu.
            Também gostaria de ver o sol se pôr várias vezes num mesmo dia, não por tristeza, mas pela beleza do espetáculo. Felizmente tive oportunidade de assistir a um pôr do sol inesquecível, valeu pelos quarenta e três do principezinho. Não apenas pela magia e doçura, mas pela singularidade do local de observação, pela história de vida do proprietário e pelo respeito demonstrado pelos turistas. Tudo aconteceu na Casapueblo, em Punta del Este, Uruguai. O lugar é hotel, museu e ateliê do renomado artista uruguaio Carlos Paez Vilaró, de 89 anos. Ele é pintor, escultor, compositor, escritor, muralista e construtor. Casapueblo é a sua “escultura viva” em frente ao mar, toda branca, formada por partes arredondadas que simulam os ninhos de barro do pássaro Forneiro, comum na região. Foi construída à mão, em vários estágios, durante 30 anos, e todos os quartos, salas e varandas são voltados para o mar e ligadas por corredores que  formam um verdadeiro labirinto. Quando Vilaró terminou a construção percebeu, surpreso, que a cidadela havia ficado com a forma do mapa do Brasil. No museu encontram-se quadros e esculturas do artista, com cores vibrantes e que abordam principalmente os temas cultura afro uruguaia e mulher. Cada cor tem um significado: o azul colonial é nostalgia, o branco é ansiedade de ser cor, o verde é vida, o rosado é o amanhecer do amor. Em uma sala, os turistas podem assistir a um filme sobre o artista, no qual Vilaró narra suas viagens e mostra suas obras ao redor do mundo. Conta do acidente em 1972 com o filho, Carlos Miguel, que viajava de avião e este caiu na cordilheira dos Andes, no Chile. Depois de 72 dias, 16 sobreviventes foram encontrados e entre eles estava seu filho. No filme, a descrição que Vilaró faz do abraço que deu no filho, quando o encontrou, dá vontade de chorar. Vilaró nunca desistiu de procurá-lo e conversava com ele todas as noites olhando para a lua(escreveu o livro “Entre mi hijo y yo, la luna”). 
Assim, num local construído por uma pessoa tão especial, centenas de pessoas esperavam o pôr do sol do alto da Casapueblo, olhando a vastidão do horizonte se encontrando com o mar. Matizes de vermelho, laranja e roxo cobriam o céu (eu não sabia que o roxo combinava tanto com laranja). Momento de silêncio, de respeito, de magia. Hora de agradecer a Deus por mais um dia, pelos momentos difíceis e pelos bons momentos, de sentir que a vida vale a pena. Uma foto, um abraço, um afago, o vento no rosto, o barulho do mar, o céu colorido, o sol como uma imensa bola de fogo baixando devagar. Quando desapareceu, as pessoas bateram palmas e algumas brindaram com vinho. Ao fundo, a voz gravada de Vilaró: “tchau, sol, te quiero mucho, gracias por tu encanto”. Tudo muito lindo, até senti a presença do Pequeno Príncipe por lá. 




domingo, 7 de abril de 2013

Redação no Enem


Obs: Texto escrito por mim, com os depoimentos do meu marido, José de Paulo.

Tenho acompanhado com atenção os noticiários sobre as correções das redações do Enem. Fui presidente da Comissão Permanente de Vestibular (COPEV) da UFU no período de 1981 a 1993, quando era obrigatória, por lei, a existência de redação no vestibular. A correção sempre foi preocupante, mesmo com examinadores capacitados, envolvidos e treinados. Embora existissem critérios de correção bem definidos, a nota variava de examinador para examinador. E diferenças mínimas de notas, em cursos concorridos, podem classificar um aluno e eliminar outro. Assim, embora seja inegável que o aluno precise escrever bem ao ingressar na universidade, a redação, em um processo seletivo, não é apropriada para avaliar isso, pois a correção não é confiável.
 Dando um exemplo concreto: os instrumentos de medições de variáveis naturais devem ter precisão, sem a qual esses instrumentos perdem suas finalidadades. Citamos repetitividade, sensibilidade, justeza, confiabilidade. Podemos ilustrar isso com o uso de termômetro para medir a temperatura de um sistema. Se o termômetro possui a característica da repetitividade, deve indicar a mesma temperatura para o mesmo sistema quantas vezes for medida; terá sensibilidade se for capaz de indicar pequenas variações reais de temperatura para o mesmo sistema; terá justeza se indicar o mesmo valor de temperatura para diferentes sistemas de igual temperatura. Ao apresentar essas três características, o termômetro então será confiável. A ausência de confiabilidade compromete instrumentos como medidores de pressão, de nível, de comprimento, de tempo, de umidade relativa, de velocidade e outros.
Fazendo um paralelo com as redações, a falta de confiabilidade na correção das mesmas compromete a redação como sendo uma maneira eficaz de avaliar o conhecimento do aluno de forma quantitativa. A nota atribuída a cada redação deveria ser confiável, aproximando-se o mais possível da confiabilidade ideal. Dessa forma, a correção criteriosa de uma redação resultaria em uma nota que seria sempre repetida, qualquer que fosse o examinador. No entanto, isso não acontece, conforme vivenciei enquanto presidente da COPEV. Na época, testava a correção enviando cópias de uma mesma redação para diferentes bancas. A redação valia trinta pontos e cada banca era composta por três examinadores. Cada um atribuía nota de zero a dez, sendo a nota final a somatória das três notas. Era preocupante como as notas de uma mesma redação variavam muito de uma banca para outra. E, mais espantoso ainda, se a mesma redação fosse corrigida duas vezes por uma mesma banca, as notas seriam diferentes.  Quando a redação deixou de ser obrigatória, propus à UFU a exclusão da redação como instrumento de avaliação do aluno no vestibular, mas não obtive êxito.
Agora, leio na Revista Veja (27/03/2013) que o Enem pode virar piada por causa da correção das redações. Receita de Miojo, hino do Palmeiras e erros grosseiros de português foram bem avaliados. Os 4,2 milhões de redações foram corrigidas por 5.596 profissionais, que gastaram cerca de 1,5 min em cada redação para avaliar itens complexos como o domínio da norma culta da língua e a capacidade de construir argumentações sólidas sobre o tema. Tudo isso vem reforçar minha opinião de que a redação é uma forma injusta de avaliar os alunos ingressantes nas universidades. Deveria ser excluída do Enem e de qualquer outro processo seletivo.

José de Paulo Carvalho




terça-feira, 12 de março de 2013

O prato de nhoque

O prato de nhoque na mesinha da cabine 


            Em fevereiro agora, juntamente com familiares e amigos, fizemos um cruzeiro em um navio luxuoso. Treze andares com escadarias e elevadores dourados, salões diversos, teatro, cassino, corredores compridos atapetados, restaurantes finos, piscinas de todo tipo, comida à vontade, muitos shows e diversão. A bordo, 3500 passageiros (alguns vomitando) e quase 1000 tripulantes de várias nacionalidades, singrando os mares. O mar, meu Deus, o mar! Uma imensidão azul, se encontrando no horizonte com o céu, lindo.
            Em meio a tudo isso, o Zé, meu marido, e eu. Ele, dizendo que o navio era um regime de engorda, só comer e dormir. E eu, querendo aproveitar cada minuto e conhecer tudo. Nesse contexto, certa noite fui jantar com o meu grupo. Éramos sempre seis pessoas na mesa, mas nesta noite faltava o Zé. Ele estava com dores no corpo e preferiu ficar na cabine (o que mais gostou no navio foi da cabine, de ficar esparramado na cama larga). Eu estava faminta, esfomeada, nervosa de fome e resolvi pedir quatro pratos: uma massa enroladinha de entrada, salada, nhoque e o prato principal, lagarto fatiado com arroz e legumes (felizmente não pedi sobremesa). Deliciei-me com o primeiro e o segundo pratos, mas quando o garçom trouxe o nhoque, desanimei. Estava bonito e apetitoso, com muito molho e queijo ralado por cima, os pedacinhos de nhoque caprichosamente dispostos no prato. Mas eu pensava no prato principal, que ainda teria que comer, e fiquei angustiada. Tentei empurrar o prato pra alguém da mesa. Não deu certo. Sugeri dividir um pouquinho pra cada um. Não quiseram. Fiquei então num dilema, não poderia desperdiçar um prato daqueles, tão gostoso e com tanta gente passando fome no mundo. Daí,tive uma idéia genial: levar o prato pro Zé, que estava sozinho e abandonado na cabine, decerto com fome. Mas não sabia se podia sair de um restaurante tão distinto, carregando um prato de nhoque. Ainda mais no famoso dia do jantar do comandante, com as mulheres de vestidos longos, cheias de colares, e os homens de terno e gravata.  Os companheiros da mesa me apoiaram e resolvi arriscar. Tampei o prato de nhoque com outro prato e fui saindo de fininho. No que dei três passos, fui cercada por dois garçons e pelo “chef de cuisine”. Vergonha total, eu me sentindo uma assassina, gente olhando. Perguntaram o que eu ia fazer, expliquei que meu marido estava doente e que ia levar o nhoque pra ele. Disseram que não podiam permitir, pois eu poderia cair com o prato, me cortar toda, perder muito sangue, quebrar a perna e culpar o restaurante. O “chef” falou grosso, com um sotaque estranho, que tinha gente pra fazer isso, anotou o número da minha cabine e tomou o prato das minhas mãos, nem pude fazer nada. Voltei cabisbaixa pra mesa. Pensei: “mesmo se quiserem entregar, nunca vão conseguir acordar o Zé batendo na porta”. Comi o prato principal, dei umas voltas pelo navio e até me esqueci do incidente.
          Mais tarde, quando abri a porta da cabine, fiquei surpresa: eles tinham mesmo levado o nhoque e conseguido acordar o Zé! Ele estava sem camisa, sentado na cama e saboreando o prato de nhoque, que estava numa mesinha dourada. Contou que bateram “muuuito” forte na porta, ele abriu e entrou um asiático alto, que falou “bueno apetito”. O Zé ficou feliz e emocionado por eu ter me lembrado dele. Na verdade, não foi bem assim, mas valeu, pois ele disse que foi o melhor prato que comeu no navio.

sexta-feira, 1 de março de 2013

Criatividade



Gosto de textos criativos e divertidos. Por exemplo, “Crônica da loucura”, de Luis Fernando Veríssimo e textos que circulam na internet, como a análise psicológica da música “Esse cara sou eu” e o texto sobre a criação, onde Deus e Satanás travam uma batalha.
Na “Crônica da loucura”, Veríssimo afirma que o melhor da terapia é ficar observando os colegas loucos na sala de espera do analista (que é mais louco que todos eles). Um dia, estavam na sala: ele; um crioulinho bem vestido; um senhor de terno preto; uma velha gorda. Começou a imaginar qual seria o problema de cada um, partindo do princípio de que todos eram loucos como ele. O pretinho tinha um olhar cansado, os tênis gastos e carregava uma mala. Concluiu que dentro deveria estar o corpo da namorada esquartejada. Ou, então, apenas a cabeça. Ele deveria ser um assassino ou um suicida. Perigoso.  Já o senhor de terno tinha um pequeno tique no olho esquerdo. Roia as unhas. Insegurança total, mal amado, medo de viver. Deveria ser um corno. Manso. Ou seria um homossexual? Não, ninguém beijaria um homem com um bigode daqueles. Tingido. Mas a melhor mesmo, a mais louca, era a gorda baixinha. Como sofria. Não devia fazer amor há mais de 30 anos. Seria uma velha masturbadora? Não, pois tirou um terço da bolsa e começou a rezar. O problema era mais grave do que ele pensava. Na conversa com o analista, contou da “viagem” dele na sala de espera. O analista riu, riu muito. Explicou que o Ditinho era o seu “office-boy”, o de terno preto um representante de laboratório e a gordinha era a sua mãe. E o analista concluiu: “e você, não vai ter alta tão cedo...”
Na análise psicológica da canção “Esse cara sou eu”, o autor  cita cada trecho e comenta. Por exemplo: “o cara que pensa em você toda hora, que conta os segundos se você demora, que está todo tempo querendo te ver”, indica um cara obcecado, grudento, com fortes indícios de ciúme doentio. No trecho “está do seu lado pro que der e vier, o herói esperado por toda mulher, por você ele encara o perigo”, indica que o cara tem a síndrome do super herói, se posicionando como um salvador e dominando a mulher. Quando diz quatro vezes “esse cara sou eu, esse cara sou eu”, mostra dificuldades de afirmação. O autor conclui que o cara é passional, obsessivo, com grande potencial para violência e aconselha: “Fuja dele”.
No terceiro texto, “A criação”, o autor conta que tudo que Deus fazia para o bem do homem, Satanás atrapalhava. Por exemplo: “No início, Deus criou o Céu e a Terra, e povoou a Terra com brócolis, couveflores e espinafres, para que o Homem e a mulher tivessem vida longa e saudável. Então Satanás criou os sorvetes cremosos da Parmalat e da Haagen-Dazs. E Satanás disse: “Vocês querem que eu acrescente calda de chocolate?” O Homem e a mulher quiseram, engordaram cinco quilos e Satanás sorriu”. Deus então criou a carne magra grelhada, e Satanás criou a rede de McDonald´s e seus cheesburgers gigantes. E por ai foi, até que o Homem teve uma parada cardíaca. Então Deus criou o marcapasso e os stents e Satanás criou o Sistema Único de Saúde, o SUS e Amém!
Mas criativas mesmo são as pessoas mostradas em uma foto na internet, intitulada “Fila na Bahia”. Elas enfileiraram seus sapatos, chinelos e sandálias e ficaram sentadinhas, de braços cruzados e descalças, esperando o clichê abrir, com os sapatos marcando o lugar de cada uma. Acabaram com as filas...  



sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Django muito livre


Django e Schultz em ação

           Adoro filmes, mas nunca me atrevi a escrever sobre nenhum. No entanto, assisti “Django Livre” e, do ponto de vista de uma cidadã comum, ainda nem sei se foi um dos melhores filmes que já assisti ou se estou em estado de choque com tanto tiro, tanta morte e tanto sangue. Penso que o definiria como um filme empolgante, que prende a atenção do começo ao fim, que possui um elenco de atores fabulosos e uma trilha sonora linda, mas com superávit de sangue e violência.
È também um filme original, no qual os escravos do sul, dois anos antes da guerra civil nos Estados Unidos, literalmente mandam pelos ares os seus opressores. O ator principal, Django (Jamie Foxx), é um escravo liberto que fica livre até demais, passando a ser um justiceiro que explode todos que fazem injustiça a ele e à sua mulher, uma escrava da qual foi separado. O filme causa espanto o tempo todo, tanto nos seus protagonistas como na platéia. Os negros escravos passam de um espanto a outro quando vêm outro negro, Django, montado a cavalo, passeando livremente pela cidade (fato inadmissível naquela época). Também Django se espanta em vários momentos com a esperteza e astúcia do seu salvador, o caçador de recompensas King Schultz (Christoph Waltz, um ator austríaco excepcional) e com a elegância e a frieza desse ao matar. Espanta-se também quando Schultz o deixa escolher uma roupa para se passar por fidalgo, a fim de irem para uma fazenda e matar três foragidos da justiça. Django escolhe uma roupa azul turqueza, bem justa, com babados e enfeites brancos.  Ai é a vez da platéia se espantar e cair na risada.
Como esse, há vários outros momentos hilários. Por exemplo, quando vários homens aparecem galopando à noite, com os rostos cobertos por capuzes e empunhando tochas acesas. Planejavam matar Django e Schultz, que estariam dormindo em uma carroça no meio do descampado (mas estavam escondidinhos no alto do morro). De repente, quando o grupo planejava como escalpelar e retirar toda a pele do Django, um dos componentes começou a reclamar do capuz, dizendo que os orifícios dos olhos estavam no lugar errado e não conseguia enxergar nada. Disse que a mãe do outro não sabia nem costurar e que ia tirar o capuz. A discussão se generalizou e a platéia caiu na risada. Resultado: acabaram todos mortos pelas balas do Django e do Shultz, uma carnificina geral. Aí a platéia parou de rir (penso que o Tarantino, o diretor, é genial, mas um pouco tresloucado). Outras cenas engraçadas acontecem com Stephen (Samuel L. Jackson) um negro velho que manipula seu proprietário, o fazendeiro depravado e muito louco Calvin Candie (Leonardo DiCaprio). Stephen é racista, não gosta de outros negros e se horroriza com a liberdade e a petulância do Django.
Acredito que essas cenas cômicas são para quebrar o horror da matança, do sangue derramado, das cabeças explodindo, das pernas e braços sendo dilacerados, dos escravos lutando até a morte para divertir Candie, dos cachorros ferozes trucidando um escravo fugitivo (essa parte eu não vi, fechei os olhos).
ulher, sua ue explode todos que fazem injustiça a atençao nao  Assisti ao filme com o Zé, meu marido, que além de não gostar de cinema, quando vai, sempre me pede para cutucá-lo se ele dormir e roncar. Nem foi preciso, com tanto tiro ele não dormiu (disse que até pensou em se esconder atrás da poltrona). Tentei arrancar dele algum comentário e ele disse, lacônico: “a tecnologia é incrível, mas acho que é um filme que desperta o ódio racial”. E pronto.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

O sorriso do Moisés

Moisés com vinte dias

               Esse Moisés não é o profeta da Bíblia, que nasceu no Egito, foi colocado em um cestinho no rio Nilo e adotado pela filha do Faraó. Esse Moisés é o meu neto número 11 que nasceu em novembro, em Serra Grande, perto de Ilhéus, o terceiro rebento da minha filha.
            Ele veio ao mundo de parto natural (natural demais), assistido apenas por uma parteira de origem indígena e pelo meu genro. A filha, que não tem medo das dores, depois de dez horas de contrações e nenhuma anestesia, deu a luz de cócoras e realizou o sonho de ter um bebê quase sozinha. Aliás, parece que na Bahia isso é muito normal. O motorista de táxi, que me conduziu até a praia de Algodões, contou-me que já nasceram duas crianças dentro do seu táxi, no caminho entre Itacaré e Ilhéus. Ele fez o parto tão direitinho que a família o chamou para padrinho. Também a Elizabeth, mãe do meu genro e que tem nome de rainha, teve onze filhos, sozinha e Deus.
        Mas, voltando ao Moisés, parecia que tudo estava bem. Ele era forte, chorou ao nascer, era moreninho e a cara do pai. Apenas não tinha tanta vontade de mamar e no primeiro dia de vida já estava um pouco amarelinho. No segundo dia, assim que o conheci, a filha e eu o levamos a uma pediatra em um hospital em Ilhéus. A médica o diagnosticou com icterícia do recém nascido que ocorre antes das 24h de vida, por incompatibilidade do sistema ABO (mãe tipo sanguíneo O e Moisés tipo B) e indicou imediata internação hospitalar. Feito o exame de sangue, verificou-se que a taxa de bilirrubina dele estava em 27 mg/100ml (o normal seria em torno de 1 a 5). Muito perigoso, pois a bilirrubina pode se impregnar no cérebro, causando surdez, paralisia cerebral, retardo mental e mesmo a morte. E não é possível saber a que momento do processo isso vai acontecer. Ele estava no limite para fazer a exsanguineotransfusão, ou seja, trocar todo o sangue, um procedimento arriscado (se tivesse nascido em hospital, poderia ter sido socorrido mais cedo). Em Ilhéus, não havia como, teríamos que ir às pressas para algum hospital em Salvador. Tentou-se então a fototerapia intensiva, mas com aparelhos precários, mesmo sendo o melhor hospital de Ilhéus. Assim, a Ilhéus que vivenciei não foi aquela do Jorge Amado, da Gabriela que tinha o cheiro do cravo e a cor de canela. Passamos lá, a filha e eu, muita aflição, muita dor e muita angústia. Depois de quatro dias de fototerapia, o bebê teve alta com bilirrubina ainda de 20 (ou seja, não poderia ter saído do hospital). Enfrentamos uma estrada de chão horrível (o Moisés com seis dias e a mãe cheia de pontos, dirigindo) e fomos pra casa. Ficamos um dia apenas. Depois de contatos com outros médicos, levamos o Moisés para Salvador, mais sete horas de viagem, a mãe dirigindo. Mais angústia, sofrimento, internação hospitalar (a bilirrubina estava a 21,7) e fototerapia intensiva, porém desta vez com aparelhos apropriados. No terceiro dia, o Moisés teve alta, mas continuou amarelinho por um bom tempo.
            Hoje, com dois meses, olhos espertos cor de jabuticaba e dobrinhas pra todo lado, ele sorri um sorriso lindo que a tudo ilumina (seu nome significa “aquele que dá a luz”). Sei que não realizará grandes feitos como seu xará, o da Bíblia, o Moisés que liderou o povo judeu para fugir da escravidão, abriu uma passagem no Mar Vermelho e recebeu os 10 mandamentos. Mas, mesmo tão pequenino, o meu Moisés já venceu uma grande batalha. Que Deus o ilumine sempre e o proteja. 

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Batman Joaquim


            Está circulando na internet uma foto impressionante: o ministro Joaquim Barbosa, de costas, com a toga preta esvoaçando como se fosse a capa do Batman, calça e sapatos pretos. Abaixo da foto, os dizeres: “Batman é para os fracos. O meu herói é negro, usa toga preta e está em Brasília, lutando contra os maiores vilões da história do Brasil. Obrigado, ministro.”
            Realmente, Joaquim Barbosa se transformou em um herói nacional, um ídolo de milhões de brasileiros indignados, um ministro sem medo, que faz seu trabalho com retidão. Ele tem mesmo muitas semelhanças com o Batman, o super herói das histórias em quadrinhos. Os dois não têm super-poderes, mas lutam contra o crime e querem fazer justiça. Usam armas como inteligência genial, habilidades investigativas e estratégias diversificadas. Os inimigos do Batman, entre outros, são o Coringa (o palhaço louco), o Pingüim e o Mr. Freeze, um vilão disposto a transformar a metrópole em um domínio gelado. Já o Batman Joaquim, de carne e osso, luta contra o Dirceu, o Valério, o Delúbio, o Genoino, o Duda e tantos outros que compõem os 40 réus do mensalão. Como divulgado na mídia, mais que a carência de heróís, foi a fartura de ladrões que transformou um juiz do Supremo Tribunal em campeão de popularidade.
O Batman tem muitos amigos na sua luta por justiça, como o Robin, o Superman, a Mulher Maravilha, o comissário Gordon. Já o Batman Joaquim tem a seu lado todos os brasileiros que voltaram a acreditar que o Brasil ainda tem jeito e que existem juízes que falam o que o povo tem vontade de dizer. Que analisam provas e depoimentos, que enxergam os fatos como eles são e que mostram que corrupção dá cadeia.
No entanto, em alguns aspectos, o Batman Joaquim é inferior ao Batman super herói. Esse último é um atleta incomparável, que treinou  artes marciais e técnicas de combate, sendo hábil no combate corpo a corpo. O Batman Joaquim, não. Além de não ter físico de atleta, sofre de dores de coluna. Mas, como escreveu a cronista Eliane Cantanhêde: “Joaquim Barbosa é respaldado pela toga, justificado pelas dores de coluna, perdoado pelas origens e exposto pelas transmissões ao vivo”.
Outras diferenças entre os dois: Batman é filho único, nasceu em Gotham City e ficou bilionário quando os pais morreram. Usava a identidade secreta de Bruce Waine, um empresário playboy e filantropo. Já Batman Joaquim é filho de pedreiro, primogênito de oito irmãos, nasceu em Paracatu e passou a ser arrimo de família quando os pais se separaram. Enquanto Batman viajou pelo mundo tentando compreender a mente criminosa, Batman Joaquim fez mestrado e doutorado no exterior, é fluente em francês, inglês, alemão, espanhol e toca piano e violino desde os 16 anos (tudo isso sem precisar de cotas). Batman é um gênio em disfarces e mestre na arte de fuga. Batman Joaquim não: fala ao vivo para milhões de telespectadores e não quer fugir de nada. Disseca as entranhas do governo Lula e os podres do José Dirceu e do PT. Enquanto o Batman geralmente age à noite, usando as habilidades de morcego e o codinome “Cavaleiro das Trevas’, Batman Joaquim age durante o dia, mostrando claramente quem está buscando desculpas para justificar o injustificável.
 Enquanto isso, o mensalão “embrulha” o estômago dos réus. E tem pizzaria em Brasília aproveitando a ocasião, com o slogan: “se tudo acabar em pizza, você já está no lugar certo”. Sem chances, enquanto o Batman Joaquim estiver em ação.

Obs: publicado no Jornal Correio em 14/10/2012