A cada dois dias tentarei colocar um texto novo, para manter o interesse dos meus leitores e também algumas fotos para exemplificar alguns textos. Obrigada pelo apoio.

quarta-feira, 25 de agosto de 2021

Daisy e Dama: histórias cruzadas




             Em tempos de pandemia, com tantas tristezas e problemas acontecendo, é bom escrever sobre assuntos leves e insignificantes, para diminuir o stress. Jerry Seinfeld, por exemplo, o famoso comediante, ator e escritor americano, escreveu o divertido bestseller "Melhor livro sobre nada", abordando assuntos variados como pedaços grandes de pães, sobrancelhas desiguais, bolsos de paletó de pijama, sanduiches de atum em aeroportos, coisas fritas em forma de pauzinhos, etc. Também vou escrever sobre quase nada: a história verídica  de uma vaca e de uma cadela.

          A Daisy é uma vaca nelorada branca, com cerca de dois anos, que nasceu na Fazenda Olhos D'Água, município de Buritizeiro. Pertence à minha netinha americana, a Lia, que a comprou do avô Zé (meu finado marido), depois de passar um longo tempo juntando sua mesadinha em dólares. Deu-lhe o nome de Daisy, que significa margarida, em inglês. A vaca foi marcada com o nome "LIA" e foi crescendo feliz da vida no pasto que parecia um jardim. Mas eis que, de repente, a fazenda foi vendida, juntamente com todo o gado que por lá vivia. Menos a Daisy. A Lia não vendia, não dava, não emprestava. Queria que ela desse um bezerrinho. Assim, o comprador da fazenda deixou que ela ficasse por lá, de favor. Uns dois meses depois,  o  encarregado da fazenda avisou que ela  tinha cruzado. Portanto, deveria estar  grávida, prenhe ou mojando, sei lá. De qualquer forma, um bezerrinho estava a caminho. Resolvi levá-la para a outra fazendinha, Ouro Verde, que não tinha sido vendida.  Lá se foi ela, sozinha, parecendo uma rainha,  no caminhão contratado só para  levá-la. Chegando no local, foi um duro aprendizado. Teve que ser aceita no bando das vacas selvagens do vizinho (empresto o pasto para umas oito vacas dele), procurar o seu alimento roendo frutinhos no chão e mascando folhas das árvores, beber água no rio sem cair dentro. Nada de água no cocho e capim braquiária verdinho, acabou a mordomia. Emagreceu e ficou abatida, os ossos das costelas aparecendo. Mas reagiu, foi uma sobrevivente.  Adaptou-se à vida dura sem pasto e começou a engordar. Com isso, o bezerrinho deveria estar crescendo saudável na barriga, para alegria da Lia. Mas certo dia o caseiro avisou-me que a vaca tinha sumido, não estava na fazenda. Como assim? A fazenda só tinha uma vaca, não era minha e ainda sumia? Depois de muita procura e confusão, encontraram a Daisy e as companheiras do vizinho, entranhadas no meio do mato.  Tudo bem, até dia desses, em agosto agora, quando estive na fazenda. Fui tirar fotos da Daisy para mostrar para a Lia e fiquei encabulada com a barriga dela. Aliás, com a falta de barriga. Fiz as contas: quando ela foi para a Ouro Verde, deveria estar prenhe de dois meses. Mais três meses que está lá, cinco meses de prenhez. A barriga deveria estar aparecendo. Chamei o caseiro, ele analisou e concluiu que ela não estava prenhe. Nem grávida, nem mojando.  Deus do céu, lá se foi o bezerrinho. Não tenho coragem de contar para a Lia. Para piorar, não tem nenhum boi por lá.

           Bem, agora entra em cena a Dama, a cadela perdigueira de estimação do meu filho. É lisinha, branca com cabeça e orelhas pretas, educada e amiga. Vive em um cercadinho na casa dele e sempre que vai para a fazenda de eucaliptos, que  possui em Várzea da Palma, a Dama vai junto, presa  na sua gaiolinha na parte de trás do carro. Dessa última vez, ela  ficou comigo na Ouro Verde e o filho seguiu para a outra fazenda. Penso que estranhou o local, mesmo correndo e pulando sem parar, porque á noite dava voltas na casa e gemia debaixo da minha janela. Por precaução, eu a levei  pra todo canto onde fui. Numa fazendinha perto da minha, onde fui olhar duas vacas pra comprar,  deixei-a  descer da gaiolinha e ficar correndo por ali. Mas na hora de voltar, ela tinha desaparecido. Chamamos, procuramos na estrada, o morador montou a cavalo e procurou pelos pastos. Nada. Passei a noite preocupada em como contar para a Lia que o bezerrinho não existia mais e como contar para o filho que sua cadela de estimação já era. Foi assim que a história da Daisy e da Dama se cruzaram: perdi um bezerro e uma cadela no mesmo dia. Mas no dia seguinte, inconformada, levantei-me ás seis da manhã e fui andando por perto chamando a Dama, quem sabe. Daí avistei o carro do caseiro  vindo devagarzinho pela estrada. Com a cabeça e a língua pra fora da janela, lá estava a Dama! Fiquei até com lágrimas nos olhos e penso que ela também, quando pulou estabanada em cima de mim. Havia passado a noite gemendo em volta da casa da outra fazendinha onde tinha desaparecido. O morador tentou ajudar, guardando-a  dentro de casa, mas ela é ensinada a não entrar . Tentou laçá-la para não fugir, mas ela disparava pelo pasto. No entanto, quando ela viu o carro do caseiro, correu para ele e entrou. Cachorro é inteligente mesmo. Voltou manca, sedenta e faminta, mas voltou. Fiquei feliz demais.

           Quanto ao bezerrinho, quem sabe a barriga da Daisy é murcha mesmo e ele ainda está por lá. Ou algum boi do vizinho pode pular a cerca e resolver o problema. A esperança é a última que morre.