A cada dois dias tentarei colocar um texto novo, para manter o interesse dos meus leitores e também algumas fotos para exemplificar alguns textos. Obrigada pelo apoio.

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Diferenças e contrastes

Karine e Djalma no dia do casamento

Yara com um ano e oito meses

Tim sentada na rede

Recebi uma encantadora foto por email. Nela, cerca de 30 crianças indianas, com pele escura, cabelos pretos e lisos e roupas  coloridas, fazem um círculo em volta de uma garotinha de uns dois anos, muito branca, loira e de olhos azuis. Estão rindo, com olhares curiosos, algumas tampando a boca de tanto rir, outras agachadas para darem lugar às crianças que estão atrás. Encantadas com aquela menina tão branca, de cabelos cacheados, e que não entende nada do que está acontecendo. Junto com a foto, a frase: “o estranhamento diante da diferença não precisa ser vivido na forma de racismo; é possível vivê-lo com encantamento”.
Vendo a foto, não pude deixar de pensar na minha netinha Yara, de quase dois anos. Ela se parece com a garotinha da foto e está na Índia. Ficará em Rishikesh, a capital da yoga, no Himalaya, por dois meses e meio, com a mãe, o irmãozinho e o pai. Os indianos ficam impressionados com sua brancura e com os cabelos loiros. O pai, Djalma, meu genro, também anda famoso. A pele dele é escura, como a dos indianos, mas os cabelos são do tipo dreadlocks, em longas tranças e todos querem passar as mãos e tirar fotos com ele. É mesmo uma forma de encantamento pelas diferenças.
Já escrevi sobre esse meu genro. Ele vivia em um quilombola na Bahia, junto com os pais e dez irmãos, trabalhando na extração de borracha. Vida dura, sem energia elétrica e sem água encanada. Quando foi descoberto pela minha filha, nunca tinha viajado, ido a um shopping, tomado um cerveja. Agora, a família toda entrou em um Boeing 747 e foi para Madri. Direto do calor da Bahia para os dois dias mais frios dos últimos anos na Europa, acrescentado de uma nevasca terrível na escala em Londres. De lá, desceram em Nova Deli. Imagino o Djalma, saindo da natureza sossegada para cair no turbilhão de pessoas, vacas, porcos, bicicletas, carros e toda aquela loucura que é a Índia. E sem entender o que falam. Aliás, ele não sabe nem ler (a minha filha tentou ensinar, mas não deu certo). Faz parte dos 16 milhões de brasileiros analfabetos. Até freqüentou algum tempo a escolinha do quilombola. Trabalhava o dia todo e percorria 8 km na floresta para assistir aulas que não ensinavam nada. Os sobrinhos ainda hoje continuam tentando, assim como sua irmã, carinhosamente chamada de Tim. Calada, sempre sorrindo, cabelos escovados e enfeitados, braços troncudinhos de carregar água no balde (ela tem 28 anos mas parece uma menininha, pois não cresceu). Somente agora, na sétima série, desistiu de estudar. Durante muito tempo, foi de canoa, estudar em Maraú, para quase nada (iguais ao caso dela, conheço vários).
E aí, de repente, leio um artigo de Roberto Pompeu, na revista Veja, intitulado Homo connectus. Ele descreve essa nova espécie,  formada por pessoas que carregam o smartphone pra todo canto e que partilham a vida com ele. Que olham para seus iPhones muito mais do que umas para as outras, receando perder uma notícia importante, uma mensagem, deixar de fazer uma consulta no Google. Por isso, cada pessoa fica partida ao meio: metade dela se comunica com as pessoas em volta, metade afaga o smartphone com os dedos. Um olho na pessoa, outro olho na telinha, em uma conexão total com o mundo inteiro.
Realmente, parte da humanidade já passou (ou evoluiu?) de Homo sapiens para Homo connectus. Mas o contraste é enorme entre o mundo digital e o mundo que não sabe nem ler.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

A melhor idade?

Turma da melhor idade fazendo pose em Madri

      Existem muitas frases interessantes e bem humoradas sobre a meia idade, como: “você sabe que está chegando na meia idade quando tudo dói ou o que não dói não funciona”; “meia idade é quando sabemos todas as respostas e ninguém nos pergunta nada”; “os anos começam a aparecer na cintura e a cintura começa a desaparecer”; “você tem vontade, mas não se lembra de quê”; “primeiro começa a esquecer os nomes, depois os rostos, depois de fechar o zíper”; ‘meia idade é  quando você tem vontade de fazer exercício físico e dorme mais, esperando a vontade passar (o Zé, meu marido, faz isso).  As minhas preferidas são: “podes viver sem sexo, mas não sem óculos” e a frase daquela garotinha, que tentava explicar o que são os avós: “quase todos são velhinhos, usam óculos e já vi alguns tirando os dentes e as gengivas”.
            Realmente, é uma fase na qual os óculos são vitais (eu, sem óculos, nem escuto). E só quem usa sabe como é, sem eles a gente não é nada. O pior é que os óculos sempre desaparecem, são esquecidos nos lugares mais estranhos, são pisoteados, amassados, carro passa por cima. Mas ruim mesmo é quando você troca os seus óculos com o de outra pessoa. Certa vez, fui dar uma voltinha no quarteirão com minha mãe, já velha, gorduchinha e que usava óculos de grau com aro marrom. Peguei os óculos em cima da mesa, ela colocou, segurou apertado no meu braço e lá fomos. No meio do quarteirão, quando foi subir o degrauzinho do passeio, tropeçou e foi caindo devagar. Mas caiu direitinho, sentada. Ficamos rindo, ela amoleceu e não conseguia se levantar. Voltamos depois de um bom tempo e ela sentou-se na varanda. Apareceu a minha cunhada, desesperada, procurando os óculos dela, que estavam em cima da mesa e que desapareceram. Perguntei como eles eram, ela olhou para o rosto da minha mãe e disse: “uai, igualzinho a este, de aro marrom”. Resultado: os óculos não eram os da minha mãe e ela caiu porque não conseguiu enxergar a altura do passeio, culpa minha.
            As dentaduras também são problemáticas (já vi dentadura caindo quando a pessoa riu). Tenho até um tio que perdeu a dentadura no mar. Quando a onda veio, bem forte, ele, que não tinha costume com mar bravio, não sabia se segurava o calção ou firmava a dentadura. Não conseguiu fazer nem uma coisa nem outra. Saiu do mar enrolado numa saída de praia e banguelo.
     Lembrei-me do Zé, quando aquela garotinha disse que já viu uns avós tirarem os dentes e as gengivas. Ele teve que fazer uma ponte móvel com seis dentes e agora é um ritual de tirar, escovar, colocar no copo com água. Os netos andam horrorizados, mas pelo menos estão ótimos para escovar os dentes. É só falar: ”se você não escovar direito, seus dentes vão cair, como os do vovô”.
            Apesar de tudo e das definições como “a velhice não é uma batalha, é um massacre”, estar na “melhor idade” tem suas compensações. Por exemplo, não é preciso preocupações com o que seremos, pois já o somos. Nem ficar pensando com quem vamos nos casar e como conseguir um bom emprego. E tem pessoas que ficam mais charmosas e interessantes com a idade. Como escreveu Ruth de Aquino, colunista de Época: “a sociedade estabelece que idoso é quem tem mais de sessenta anos, mas é preferível empurrar o calendário pra frente. Hoje, para os sessentões, velho é quem tem mais de 80 anos. Os octagenários produtivos acham que velho é quem passa dos 90. No fim, velho mesmo é quem já morreu e não sabe”.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

A prova


Para renovar a carteira de motorista, eu precisava fazer a prova teórica. Poderia escolher entre participar de um curso presencial e fazer a prova lá mesmo ou então, estudar sozinha e fazer a prova no DETRAN. Em 30 questões objetivas, deveria acertar no mínimo 21. Pensando que seria moleza, optei por não participar do curso.
Assim, consegui um livrinho que tinha “tuudo” sobre legislação de trânsito, infrações, penalidades, sinalização, direção defensiva, primeiros socorros. Explicava a diferença entre apreensão, retenção e remoção de veículos (pra mim, era tudo a mesma coisa); o que era frenagem (pensava que era quando o carro derrapava na água); os problemas dos retrovisores convexos; a necessidade de manter uma distância de dois segundos entre dois veículos; o comportamento sub e sobre-esterçante (nunca tinha ouvido falar). As normas de conduta: mil infrações gravíssimas, graves, médias e leves, com as penalidades em cada caso. Um horror. Pulei essa parte.
No dia da prova, cinco pessoas participando. Primeira pergunta: parar o veículo na contramão da direção é infração: leve, média, média com multa, grave. Puxa, nem sabia que era infração. Depois: usar o carro para jogar água nos pedestres é: falta de educação; infração leve; média sem multa; média com multa. Tinha certeza de que era falta de educação. Aliás, deveria ser mais que isso e marquei “infração leve” (errei, era média com multa). Em seguida, perguntaram o tipo de gás existente no extintor de incêndio. Nem desconfiava. Marquei o gás ACC porque achei o mais interessante, mas nem sei se existe. Apareceram também questões bem óbvias e pensei: “essas eu acerto”. De repente, a pergunta: “se aparecer vaca e cavalo na pista, qual o procedimento a ser tomado?” Deveria decidir entre acender ou não os faróis e entre buzinar ou não. Pensei na reação dos bichos e optei por não assustar os pobres animais. Mas como as más línguas dizem que sou má motorista (acredito que é por causa do preconceito contra as mulheres ao volante), perdi a segurança e assinalei que iria acender os faróis. Lembro-me de outra difícil: “se acontecer um acidente na pista com orientações para afastar as pessoas e não acender fósforos, o acidente envolve”: incêndio; óleo na pista; fios elétricos caídos do carro; atropelamento. Concluí que não era incêndio, pois o foguinho do fósforo não faria diferença. Quanto ao óleo, pensei que não se incendiaria assim tão facilmente. Fiquei com os fios elétricos, mas sem muita convicção.
Passei as respostas para o gabarito, com capricho, preenchendo as bolinhas. Contei as questões nas quais eu “tinha certeza” que a resposta estava correta: 23. Nas outras sete, como cada questão tinha quatro alternativas, eu ainda tinha 25% de chances de acertar, mesmo sem saber nada. Tranqüilo.
Passado um tempo, o examinador leu as notas: 20, 21, 23, 24 e 26. A nota 20 era a minha, só eu “tomei bomba”, que vergonha! Ainda tive a audácia de perguntar: “Moço, você corrigiu direitinho?” Ele nem respondeu. Eu não sabia se ria, se chorava, se me escondia. A primeira “bomba” de minha vida. Não sei se foi por excesso de confiança, falta de estudo ou burrice mesmo.
Agora, estou com a carteira vencida. Aprendi no bendito livrinho que dirigir com carteira de habilitação vencida, por mais de 30 dias, é falta gravíssima, com multa e sete pontos na carteira (isso eu sei). Tenho que fazer outra prova, mas desta vez não vou contar pra ninguém se for reprovada.