A cada dois dias tentarei colocar um texto novo, para manter o interesse dos meus leitores e também algumas fotos para exemplificar alguns textos. Obrigada pelo apoio.

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Agora é você

Pai da nova geração: Chris com a filha Lia

Pai da velha geração: Zé em 1973 com os filhos Luiz Cláudio e Vinícius

Pai da geração mais antiga ainda: Padrinho Pereira (o primeiro, de branco)


        A crônica de Antônio Prata publicada na Folha e intitulada  "Sua vez", ilustra bem como os pais atuais estão participativos na criação dos filhos.
          Ele conta que estava sonhando. Vinha voando, planando devagarzinho, como naquele banquete no final do filme do "Asterix, só que o banquete era no jardim da sua avó. Voava em direção a um javali e quando estava quase dando uma dentada no glorioso pernil do animal, uma dedada em sua costela o chamou de novo ao mundo dos vivos: "Acorda, é sua vez, vai lá que ele tá chorando faz tempo." Levou uma eternidade para entender que não estava voando, não havia javali nem banquete, eram 4h da madrugada, seu filho estava chorando e ele precisava tomar uma atitude. Respondeu sonolento e com ressaca das cervejas da noite anterior: "Eu fui à uma!". Do outro lado da cama veio a resposta incontornável: "Eu fui às três!". Não teve dúvida de que seria ele a deixar aquela cama quentinha e sair tropeçando na noite escura. Talvez tivesse que fazer mamadeira ou trocar a fralda. Acabaria com cocô nas mãos, nos braços e poderia levar um jato de xixi na testa. Nessa hora, não se sentia mais uma pessoa boa, um pai esforçado, um filho da revolução cultural dos anos 60 que acredita em direitos iguais para homens e mulheres. Se sentia um monstro cujo objetivo era continuar dormindo e só enxergava o travesseiro. Pensou em não ir, mas seria divórcio na certa. Pensou em dizer que não iria porque trabalhava o dia inteiro pra sustentar a família. Mas a mulher também trabalhava e não ia dar certo. Pensou em agir como um homem dizendo que iria até a esquina comprar cigarro e nunca mais voltaria. Mas para isso teria que abrir mão do seu bem mais precioso naquele momento, a cama. Entorpecido pelo sono, pela ressaca e choro de bebê, pensou em tantas pessoas que não teriam trocado uma fralda sequer. Sentiu inveja dos colonizadores europeus. Do exército do Genghis Khan. Dos romanos e gauleses. Homens num mundo de homens, para homens.  Passou então a maldizer  o iluminismo, a psicanálise, o século XX, os hippies, a Yoko, a Leila Diniz, o parto humanizado, as peladonas de protesto.  Recebeu outro cutucão: "Vai! É a sua vez!". E ele foi, praguejando contra a injustiça de um mundo justo.
        Pensei no Zé, meu marido. Nunca ele se levantou à noite para cuidar de filho. Certa vez, com um bebê e quatro crianças de um a seis anos, todas gripadas e de nariz entupido, eu já tinha me levantado quinze vezes. Na décima sexta, dei uma cutucada nele: "Vai, agora é você". Depois de uma eternidade, ele se sentou na beirada da cama e por lá ficou. Dei outra cutucada e ele disse: "Se eu me levantar depressa, fico tonto e caio" . Desisti de vez. 
       Bem, o Zé ao menos tentou. Pior foi o meu padrinho Pereira. Fazendeiro bonachão, quando minha madrinha cutucou-o para cuidar do filho que berrava, virou-se para o outro lado da cama e disse: "Faz assim: você olha a sua banda e deixa a minha banda chorar"...
       Neste mês de agosto, quando se comemora o dia dos pais, parabéns a todos os pais. Aos que cuidam dos filhos à noite, fazem mamadeiras e trocam fraldas. E também aos que não fazem isso, mas que conseguem ser bons pais, cada qual do seu jeito. Que sejam sempre os heróis dos seus filhos e caminhem com eles ao longo da vida, como na música do Fábio Jr: "Pai, você foi meu herói, meu bandido, hoje é muito mais que um amigo; nem você nem ninguém tá sozinho, você faz parte desse caminho,que hoje eu sigo em paz".





terça-feira, 4 de agosto de 2015

Uma estória de amor

Roque com um mês, dormindo tranquilo

Lolla e Tobias juntinhos

Duda amamentando o quinteto

          Há um ano atrás escrevi sobre o drama canino envolvendo  minhas duas filhotes de yorkshire : a Duda, grandalhona e destrambelhada e a Sissy, minúscula e meiga. No meio, o Zé, meu marido, revoltado com a Duda. Acontece que um dia a Sissy encontrou o portão aberto e fugiu. Ficou a Duda, até que um dia o Zé disse a famosa frase: -"Ou eu ou o cachorro ". Com lágrimas nos olhos, troquei a Duda pela "Duda Outra", mais calma e educada (o filho comentou que eu deveria ter trocado era o marido).
         Agora a Duda Outra encontrou um namorado, o Nick. Foi amor à primeira vista. Cruzaram inúmeras vezes e como resultado nasceram cinco filhotes, que estão com um mês: Lolla, Sissy, Tobias, Apollo e Roque. São pretinhos, brilhantes e limpinhos. A mãe os lambe dia e noite, deve ter gasto litros de saliva. E de leite também, não sei como consegue tanto. Eles estão gordinhos e saudáveis e ela, pequenina e acabada, é possível sentir os ossos da costela. As tetas são dez e matematicamente seriam duas para cada um, muito simples. Mas a natureza é complexa. Os cinco filhotes empurram uns aos outros disputando as tetas, todos querem a mesma. Quando a Duda enfeza, sai andando com os cinco dependurados. É uma mãe incrível, impressionante como sabe tudo o que tem a fazer, cachorro é assim. Defende os filhotes das pessoas que não conhece, late, avança e não deixa passar a mão. Tenta carregá-los pelo pescoço quando caem da caminha, mas não tem força e nem jeito pra isso. Quando ouve um ganindo, corre pra acudir, sai derrapando pelo caminho. Pariu sozinha, cortou o cordão umbilical de todos, comeu as placentas sanguinolentas, limpou os filhotinhos, deitou em cima deles para aquecer e já começou a amamentar. Deve ter ficado encantada com  tanto cachorrinho saindo do seu corpo. Não sei se ela consegue perceber o desenvolvimento deles. Levaram 12 dias para abrir os olhos e no começo só dormiam e mamavam. Depois passaram a se arrastar e agora já caminham devagar e tentam brincar uns com os outros. A Lolla é a maior e bem tranquila, deve roubar o leite dos outros. O Roque é pequenino, espevitado e chorão, deve andar estressado com a competição pelas tetas. Logo os dentinhos vão aparecer, machucar as tetas e a Duda vai empurrá-los.
        É lindo ver e acompanhar essa estória de amor incondicional de uma cadelinha com seus filhotes. Mas logo ela não vai querer mais saber deles, vai ignorá-los e seguir com sua vidinha de cão, sem nem se lembrar que eles existiram. Na mãe humana não, o amor pelo filho é para sempre. Por isso cachorro é cachorro e gente é gente. Sei que existem muitos cães abandonados e maltratados, uma maldade e injustiça com o melhor amigo do homem.  Mas existem também muitas crianças que necessitam de um lar, outras que são espancadas pelos pais, outras que passam fome, outras que tem pais que oferecem tudo, menos tempo com os filhos, talvez o que mais precisem. E tem também os velhinhos. Penso que muitos  gostariam de alguém para segurar suas mãos enrugadas e escutar suas estórias, com paciência e sem pressa. Segundo Rubem Alves,  "história" é diferente de "estória".  "História" é aquilo que aconteceu uma vez, pertence ao tempo, é ciência; quem ouve uma "história" fica do mesmo jeito. "Estória" é aquilo que acontece sempre, pertence á eternidade, é magia; quem ouve uma "estória" pode ficar outro.

        Quem sabe um dia encontraremos tempo para ouvir as estórias dos velhinhos, que por certo serão mais bonitas que a estória da Duda com seus filhotes.