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domingo, 28 de agosto de 2011

Casa arrumada

Netos lavando a casinha do quintal

Família reunida na sala de jantar, no aniversário do Zé

Carlos Drumond de Andrade escreveu : “casa arrumada é um lugar organizado, limpo, com espaço livre para circulação e uma boa entrada de luz. Mas casa tem que ser casa e não um centro cirúrgico ou um espaço de novela. Tem gente que gasta muito tempo limpando, esterelizando, afofando as almofadas. Não, eu prefiro viver num lugar onde bato os olhos e percebo logo: aqui tem vida. Sofá sem mancha? Tapete sem fio puxado? Mesa sem marca de copo? Tá na cara que é casa sem festa. Casa com vida tem que ter gavetas de entulho, ter a cara da gente e estar sempre aberta pros amigos, filhos, netos, vizinhos.”
Uma casa precisa mesmo ter vida. Ter marcas pra todo canto, ter histórias pra contar, ter aquele aconchego que chama pra ficar. Na minha casa, as portas e janelas estão sempre abertas, tem vasos e plantas por todo lado, enfeites em cima das mesas. Quadros de paisagens bucólicas, de flores, pássaros, borboletas enormes, fotos ampliadas, tudo sem muita estética. Porta retratos em quantidade, registrando as fases da vida da grande família: nascimentos, infância, casamentos, envelhecimento (meu e do Zé: charmosos no dia do casamento, enrugados nos dias atuais). Tem muita gaveta de entulho, com tudo misturado: vela de primeira comunhão, medalhas de natação, boletins escolares, cartões antigos de dia das mães. Sinteco arranhado, antes por causa das correrias e brincadeiras dos filhos, agora por causa das confusões dos netos. Mas como disse Drumond: “se o piso não tem arranhão, é porque nesta casa ninguém dança”. Na cozinha, a pia sempre repleta de louças pra lavar, que se multiplicam do nada. E a mesa, sempre pronta pra quem chegar. A biblioteca, testemunha de tantas madrugadas de estudos. O computador, onde de repente, some tudo, não sei pra onde. A sala de TV, a sala de visitas. No quintal, a casinha de plástico colorida, onde os netos brincam de tudo, menos de boneca. O jardim na frente da casa.  A “minha árvore” na calçada, uma sibipiruna imensa, minha paixão, de onde caiam folhas e florzinhas amarelas o ano todo. Mas ela sofreu uma poda drástica esta semana e agora só restaram seus galhos, como braços abertos ao céu, pedindo socorro. É de cortar o coração. Por isso, ando triste e quieta. Como escreveu Martha Medeiros, “que nos deixem quietos, daqui a pouco a gente volta, a gente sempre volta, anunciando o fim de mais uma dor - até que venha a próxima, normais que somos.”
Debaixo deste teto, tantos acontecimentos se passaram, tantos anos, tanta vida, tanta emoção. Conversas, músicas, discussões, diálogos, choros e risos. A adolescência dos filhos maiores, a infância do filho caçula, as festas de aniversário na garagem, as comemorações das formaturas, dos casamentos. A presença de tantas pessoas, sempre recebidas com alegria (mas minha mãe, que Deus a tenha, às vezes escondia rapidamente as guloseimas que estavam em cima da mesa quando chegava visita). E os bichos, meu Deus, os bichos! O Cravo e a Rosa, sempre gritando “purutaco, tataco” e “Pauliiiinho!” O Willie, o cachorrinho yorkshire que ficou deitado aos meus pés durante todos os meses que escrevi meu trabalho de mestrado. A Susy, que desapareceu; o Teddy, que foi atropelado; a Lua, que está bem velhinha e a Mel, um doce mesmo.
Enfim, em tempos em que impressiona o grande espaço que a violência ocupa na mídia, é bom pensar numa casa arrumada que tenha a cara da gente e que seja o nosso porto seguro.




Um comentário:

  1. Sinto-me orgulhoso de ter vivido nesta casa tão bem arrumada. Saudade de todos. André Carvalho

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