A cada dois dias tentarei colocar um texto novo, para manter o interesse dos meus leitores e também algumas fotos para exemplificar alguns textos. Obrigada pelo apoio.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

Jesus, Maria e José

 


                                   

            Li recentemente o livro "O Evangelho secreto da Virgem Maria", de autoria de Santiago Martín, um sacerdote católico espanhol. Ele , um aficionado por documentos antigos, pesquisou textos apócrifos sobre Maria. Esses escritos, de natureza religiosa mas não incluídos no cânone oficial das escrituras sagradas, tratam da vida de Maria, sua maternidade e seu papel na história cristã. Baseado em seus estudos, o autor escreveu o livro na primeira pessoa, como se fosse Maria contando sua vida para João, o  discípulo amado que ficou cuidando de Maria após a morte e ressureição de Jesus.

            Há trechos muito belos , que ajudam a melhor conhecer e amar Maria. Por exemplo, no capítulo "Tinha quinze anos", quando da anunciação do anjo Gabriel, Maria contou para João : "Estava no meu pequeno quarto, quando ele se encheu de luz. Estava ajoelhada , com minha roupa modesta presa acima do joelho para não gastá-la, quando ele apareceu. Eu me assustei sim, mas era um medo que não era medo. Ele estava ali, belo e luzidio, doce e cheio de paz, e era grande a minha sintonia entre sua alma e minha tranquilidade. Quando falou, assustei-me , não porque sua voz era feia, mas porque o que ele falou me deixou perplexa".

            Em outro capítulo,  intitulado "O dia seguinte", Maria conta para João que quase não dormiu aquela noite. Sabia que algo estava dentro dela , algo novo, vivo, maravillhoso. Porém, o que era? Ou melhor, quem era? Que tipo de Messias era aquele que nasceria numa aldeia perdida da Galiléia? Quem escolheria por mãe uma pobre moça, filha de um artesão? Afirma que não sabia como ocorreu, apenas aceitava que para Deus nada era impossível. Mas como poderia um ser humano ser filho de Deus? E o que diria José, a quem estava prometida em casamento? E se fosse apedrejada por adultério, como era o costume da época?"

 Conta que foi acalmada ao entender que sua força estava na confiança, no poder e no amor de Deus. Sentiu sua presença e adormeceu em seus braços.  De manhã, sua mãe, Ana, a acordou e ela se pôs a chorar. Disse-lhe: -"Vou ser mãe". Choraram abraçadas por um longo tempo.  Quando Maria contou para Ana sobre a visita do anjo Gabriel, essa disse-lhe: -"Acredito em ti, filha, pois o que contas é incrível demais para ser inventado e porque jamais tive motivos para duvidar de ti ". E quando Ana contou para Joaquim, o pai de Maria, ele ouviu tudo, sentado em um banquinho, nervoso e angustiado. Disse que a filha era a alegria de sua alma, mas sabia , desde seu nascimento, que ela pertencia a Deus.  Ajoelharam-se perto de Maria e beijaram suas mãos.

            Em vários capítulos, Maria segue contando sua vida:  como Joaquim contou para José que ela estava  grávida; o que aprendeu com a prima Izabel; o nascimento e a infância de Jesus; a morte de José; o tempo que passaram juntos até Ele completar 30 anos; a morte na cruz. No capítulo "O verbo se fez carne", sobre o nascimento de Jesus,  Maria diz para João: -"Como explicar para ti, um homem, para que compreendas? Penso que somente uma mulher compreenderia. Foi somente isso: um parto. E o menino nasceu. José estava ali, do meu lado, rompendo o costume dos homens ficarem longe das mulheres neste momento. Mas ele só conseguia manter o fogo aceso e retorcer sua túnica entre as mãos. Duas mulheres da aldeia me ajudaram. O menino nasceu como se um raio de luz atravessasse um cristal, de forma límpida. Os esforços e contrações me produziram mais angustia e nervosismo do que danos e dores. Ele nascera e eu o tinha em meus braços. Era mais uma criança , mas ao mesmo tempo única, diferente. Parecia uma luz, porém te digo, mais que uma luz, era o próprio sol. Ao tomá-lo nos braços, tão pequeno, tão frágil e enrugado, parecia-me impossível que fosse outra coisa além de uma criança normal. José o olhava com um pouco de temor e de curiosidade. Quem sabe pensava que o menino nasceria com alguma marca de poder e que desde o início seria mais forte, mais esperto, mais sobre-humano. Mas era um menino tão normal que as duas mulheres não notaram nada e foram embora. Lá fora era noite e à luz da pequena fogueira que José mantinha acesa, a gruta parecia iluminada pelo maior dos holofotes. Não que do Menino saíssem raios de luz. Ele era a própria luz. Eu não podia deixar de contemplá-lo. Pela primeira vez notei um sentimento que não tinha tido. Olhava-o e de repente comecei a adorá-lo. "

            Continuando, Maria conta que José pediu para pegar o menino, que dormia tranquilo. Segurou-o em seus braços fortes, olhou-o longamente , beijou seu rosto e lhe disse , suavemente, para não despertá-lo, que também o amava. Que não sabia que sangue corria nas suas veias, além do sangue da mãe; não sabia sequer se era um homem normal ou um ser extraordinário, sob aquela aparência tão simples; e não sabia se devia prostar-se aos seus pés, como o Messias que Ele era. Mas que dava graças ao Altíssimo por ter confiado nele para ajudar em sua obra , que o chamaria de filho, que estava ali para dar sua vida por ele, para cuidar da sua mãe e ajudá-lo na obra de Deus para a qual veio ao mundo.

            Tudo tão divino, tão lindo, tão mágico, que nem há o que falar. Apenas obrigado Jesus, Maria e José. Foi por amor a cada um de nós.

 


sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Comentários dos leitores

                                   

                Uma das recompensas ao escrever crônicas  é receber os comentários dos leitores. Alguns são tão interessantes que vale a pena divulgá-los.

                Por exemplo, na última crônica que escrevi, "Brazilian thong", sobre a mania que temos de guardar e usar coisas velhas, os comentários foram divertidos e variados. Muitas leitoras contaram que guardam o umbigo dos filhos e que , de maneira alguma, aconteça o que acontecer, irão descartá-los. Uma, que mora na fazenda, contou que sua mãe enterrou seu umbigo no mourão da porteira do curral, para ter muito gado, mas que ela não conseguiu enterrar o da filha. Outra relatou um caso assustador,  do enterro de um  homem de 33 anos que tinha um bebê de um ano. O bebê estava num quarto ao lado da sala do velório. As pessoas escutavam o choro do bebê, iam olhar e ele estava dormindo tranquilo. Depois de várias repetições desse fato, resolveram olhar nos bolsos do paletó do morto. O umbigo do bebê estava lá! Retiraram o umbigo seco do bolso e o choro parou, cruzes! Já outra escreveu que está é perdida, pois além dos umbigos, guarda todos os escritos dos filhos, desde os rabiscos do pré até as provas do curso superior. E uma professora universitária contou que conserva toda a tonelada de papel de sua vida acadêmica. Caiu na bobagem de perguntar ao marido o que ele faria se ela morresse primeiro, e ele: "Coloco tudo dentro de uma caçamba e jogo fora" . É isso aí, pra que ela foi perguntar...Igual aquela pergunta fatídica que os homens não devem fazer ás mulheres: - " Você tem que escolher: prefere eu ou o cachorro? "  Outra leitora escreveu bonito, que estava fazendo o exercício de guardar apenas memórias e pessoas queridas no coração. E uma contou um longo caso de um enterro no qual o morto estava vestido com o paletó do seu marido. Por precaução, ela resolveu olhar nos bolsos. Encontrou um pacote de notas guardadas, que por pouco não  foram enterradas.

                E as roupas velhas? A maioria dos comentários das leitoras foi de que passariam a usar só calcinhas e camisolas novas e bonitas, pois vai que...Mas uma leitora, teimosa, disse que continuaria com suas camisolas desgastadas e desbotadas mesmo, pois eram as mais confortáveis. E outra contou uma história : a filha estava muito atrasada para a escola, ela levantou-se apressada, com os cabelos desgrenhados, de meia e um pijama velho horrível, quadriculado. Colocou por cima um roupão mais horrível ainda, calçou as chinelas havaianas nos pés com meia, entraram apressadas no carro e lá se foram. Tiveram que parar na casa do ex -marido, que não se conforma com o divórcio, para a filha pegar algo. Ele, o ex,  abriu a porta e quase morreu de susto ao vê-la naqueles trajes. A leitora concluiu que foi ótimo, talvez assim ele a esqueça (a feiura às vezes pode ser útil). Ah, e tem também o relato de um médico, sobre pacientes que chegam pra  consulta bem vestidos e arrumados. Mas quando tiram a roupa para o exame médico, é um susto só. Cada cueca velha, parecendo funil, deixando tudo de fora. Sem falar das mulheres de calça comprida que revelam as pernas cabeludas ou ensebadas de creme que não tem nem como examinar os joelhos, de tão escorregadios. E o caso que contou, do homem que foi acidentado e quando tiraram a roupa dele, no hospital, estava com a calcinha da esposa?  Ainda bem que era da esposa.

                Também apareceram comentários indignados sobre o japonês  que colecionava as calcinhas, sobre as risadas gostosas que os leitores deram, e outros mais genéricos, como este elogio : "Ana, você é uma observadora do aqui e agora, com sua incrível e especial pincelada de alegria. Os assuntos mais doloridos são transmutados em festa".

                Quanto às coisas velhas que vamos guardando nas gavetas,  gostei sobretudo de um texto do Mário Quintana, enviado por uma leitora que justificava o porque de não esvaziar suas gavetas: "Eu moro em mim. Deixo sempre as janelas entreabertas pra sentir o sopro de raros afetos. A porta? Só abro para poucos. Todos os dias, eu percorro meus cômodos, corredores e contemplo a vida pela varanda. Mas, as gavetas...Ah...As gavetas? Ainda não dá para abri-las. Senão, acabo tendo que morar dentro delas". Lembrei-me do Pedro Bial, que no seu poema  "A morte", também fala sobre esvaziar gavetas. Argumenta que morrer, só mesmo quando se tem mais de cem anos, quando o sono eterno pode ser bem vindo, já que não há mais quase nada guardado nas gavetas. Ou seja, o Pedro Bial pensa que só em torno dos cem anos poderemos ter as gavetas vazias... Mas uma  leitora enviou-me texto de uma escritora sueca que escreveu o livro  "Limpeza da morte: a prática sueca de se livrar de bens acumulados em vida".  A  autora aconselha a começar a descartar coisas que não se usa e a esvaziar as gavetas a partir dos 65 anos e ressalta : "comece cedo, antes que você fique velho e fraco demais para fazer isso, nunca é cedo demais".

                Assim, penso que a partir de certa idade, ou esvaziamos as gavetas ou passamos a morar dentro delas. Simples assim.

                

 

terça-feira, 19 de novembro de 2024

Brazilian thong


                                                           BRAZILIAN THONG

 

                 Desapegar de alguns objetos pode ser um problema enorme. Ou pelas lembranças boas que eles trazem, ou por não saber como e onde descartar, ou por preguiça e comodismo, ou por pensar que podemos achar outro uso para eles. E até mesmo por nostalgia, pois podem ser uma fonte de consolo e de conforto em tempos de saudades , como penso que foi o caso da minha mãe. Velhinha, sentada no banco do quintal, certo dia separava algumas tranqueiras de uma gaveta. Encontrou uma caixinha branca, sacudiu, abriu e me perguntou: -"Sabe o que tem aqui?" Na hora, por intuição e conhecendo como ela gostava de guardar coisas velhas, respondi: "- Deve ser o meu umbigo, sequinho!" Jesus, e era! Ficamos as duas boquiabertas, ela por eu ter adivinhado e eu por ela ter guardado meu umbigo por mais de 50 anos! Enterrei-o no canteiro do jardim e encerrei o assunto.

                Mas ás vezes guardar e usar coisas velhas pode causar complicações. Como na caso de minha filha. Em uma de suas andanças como mochileira pelo mundo, com uma amiga, foi da Índia para o norte da Tailândia, para um vilarejo bucólico com piscinas termais. Hospedou-se em uma pousada, num chalé entre árvores, mais afastado. A dona do chalé, uma tailandesa pequenina, avisou-a que  tinha aparecido por ali um ladrão de calcinhas. Explicou que minha filha não precisava se preocupar, pois ela já havia preparado uma armadilha para pegar o larápio sem-vergonha: iria dependurar várias calcinhas novas e coloridas no varal e ficar de tocaia. Assim, depois do banho, minha filha, tranquila,  lavou e dependurou na varandinha do chalé a calcinha velha, com a rendinha rasgada, elástico relaxado e vários buraquinhos na malha. Pensou que estava na hora de jogá-la fora, mas como ainda teria alguns dias de viagem e na Tailândia só se encontra calçolas esquisitas pra comprar, resolveu conservá-la por mais um tempo, jamais encontraria uma calcinha confortável como as brasileiras. Dormiu com os anjos e no dia seguinte, quando olhou no varal, a calcinha tinha desaparecido! E ao longe avistou o varal da tailandesa com as calcinhas novas e coloridas tremulando ao vento, intactas.  Dias depois, a tailandesa avisou que a policia local tinha desconfiado de um turista japonês que estava hospedado lá por perto. Deram uma batida na casa dele e encontraram calcinhas de todo tipo. Assim, estavam precisando de testemunhas para reconhecer as calcinhas e a minha filha precisava ir até a delegacia reconhecer a dela. Horrorizada, minha filha disse que jamais iria até lá reconhecer a calcinha velha, tinha vergonha. Mas a tailandesa tanto insistiu que ela foi. O policial pequenino (lá todos são pequeninos) espalhou várias calcinhas sobre a mesa, ela reconheceu a calcinha esburacada, ele a colocou em um saquinho de plástico, escreveu em letras garrafais "BRAZILIAN THONG" e a guardou como prova do crime. Deve estar por lá ainda, na forma de pó. E o japonês, não se sabe o paradeiro.

                Ah, e tem também um caso local, da camisola da minha amiga. Foi assim: há alguns anos , em Uberlândia, no centro, aconteceu  a explosão de um botijão de gás durante a noite. Um acidente terrível, que danificou prédios e lojas. A minha amiga morava em um prédio próximo . Quando ouviu o estrondo da explosão, pensou que era um avião que tinha caído em cima do prédio. Levantou-se como estava, com uma camisola confortável, mas com fendas laterais,  bem velha, feia, desbotada e descosturada  nas laterais. Desceu esbaforida todos os degraus, do décimo segundo andar até o térreo, sem chinelos, sem óculos, sem nada, só de camisola velha. Todos os moradores do prédio desceram também como estavam. Quando o dia amanheceu, ficaram olhando uns para os outros, consternados, e ela encolhida na sua camisola desbotada e descosturada. Jurou que , a partir daquele dia, só dormiria com camisolas lindas e novas, pronta para qualquer explosão de botijão de gás, queda de avião ou terremoto.

                Bem, depois do umbigo, da calcinha velha e da camisola com fendas, não resta mais nada a contar.


sábado, 5 de outubro de 2024

O sujeito da oração é você


                                                  

                Não gosto de enviar mensagens de bom dia, boa tarde, boa noite...Não sei se as pessoas têm tanto tempo assim de ficarem lendo. Mas gosto de muitas que recebo. Por exemplo, desta : -"Se é para viver, vamos viver direito. Com conteúdo. Troque o verbo, mude a frase, inverta a culpa. O sujeito da oração é você. A história é sua, mãos à obra! Melhore aquele capítulo, joque fora o que não cabe mais, embole a tristeza , o medo, aceite seus erros, reescreva-se. Republique-se. Reinvente-se. E transforme-se na melhor edição feita de você."

                É isso aí. Cada um escreve a sua história. Se aquele capítulo não está bom, embola tudo, amassa, joga no lixo e começa a escrever outro. Invente, ouse, sonhe, enfrente desafios. Mesmo que dê muita confusão. Como aconteceu com a minha amiga, que não vou contar o nome, para proteger a personagem.

                Ela, professora universitária e já na casa dos 60 anos,  estava se sentindo fora do contexto social porque não tinha Facebook. Resolveu pedir auxílio à uma sobrinha para entrar nessa rede. Deu certo e já no primeiro dia, muito conhecida e amada pelos alunos, recebeu dezenas de mensagens. Algumas que achou muito estranhas, parabenizando-a e oferecendo apoio por ela ter assumido sua orientação sexual. No segundo dia, a mesma coisa. Sem entender o que acontecia, pediu socorro novamente á sobrinha. Essa chamou-a de "burra" e mostrou o problema. Havia uma pergunta na descrição do perfil: -"Você gosta de menino ou de menina ?" A minha amiga, pensando em meninos e meninas criancinhas, pensou :- " Uai, claro que gosto dos dois ". E marcou. Pronto, com isso se identificou como bissexual. E recebeu todo apoio. Apavorada, saiu do Facebook e nunca mais voltou. Embolou este capítulo e jogou fora, foi uma reinvenção que não deu certo. Mas continuou tentando se reinventar e transformar-se em uma edição melhor dela mesma. Já com dois cursos de graduação, pós-doutorado no exterior, aposentada, está agora cursando disciplina optativa na universidade. Chega na sala de aula com seus vestidinhos estampados coloridos e de alcinhas, caneta com florzinha de crochê na ponta e senta-se no meio de jovens  vestidos de preto e com tatuagem. Dia destes o professor perguntou: "  - Quem é favorável á liberação da maconha?" Todos levantaram a mão, menos ela...Ah, e teve um colega que perguntou : -" Você beija menina? Pediram para eu perguntar pra você." E ela, espantada: " Na boca???"  Depois, completou : -"Eu beijava menino, mas no momento não beijo mais nada!" Agora ela anda escrevendo o próximo capítulo.

                O importante é viver com conteúdo e se reescrever sempre. Eu, por exemplo, tentando enriquecer os capítulos finais da minha história, resolvi ser fazendeira, sem entender do assunto. Vou trocando os verbos, colocando conjunções , mudando as frases e vai dando certo . Por exemplo: "Tenho trinta vacas e não tenho nenhum boi. Não posso comprar outro porque todos os que comprei morreram. " Daí coloco uma conjunção adversativa, acrescento um verbo e resolvo o problema: "Não posso comprar um boi, MAS posso pedir um emprestado" . E os casos que acontecem por lá dão emoção aos capítulos. Como no caso da galinha. Tenho três galinhas e dois galos.  Dia desses, o caseiro enviou um aúdio avisando que o galo foi subir na galinha  e escadeirou a galinha (do verbo escadeirar, lesar a bacia abdominal e torácica)  . E ele não sabia se podia comer a galinha. Daí, coloco uma interjeição, uma conjunção causal  e encerro o drama: "Jesus!Mas isso acontece?? Melhor o caseiro comer a galinha e eu comer o galo quando for na fazenda, PORQUE ainda restará um galo e a galinha não ficará sofrendo". Lembrando que esse é um período composto e na oração sindética aditiva "e eu comer o galo" , o sujeito é o pronome pessoal reto, "eu". Porque cada um de nós  é sempre o sujeito da oração.

 

 

quinta-feira, 16 de maio de 2024

Mãe é mãe


                                              O meu primeiro filho. Depois vieram mais cinco...

              Certa vez, um menininho precisava fazer uma redação com o tema: " Mãe, só tem uma". Ele escreveu: "Cheguei em casa depois da aula, estava com fome. Queria chupar laranjas, abri a geladeira, olhei dentro e só tinha uma laranja. Daí, gritei para minha mãe: -Mãe, só tem uma!! Fim". Bem, o menininho poderia ter escrito que mãe é uma só porque só cabe uma mãe na vida de um filho, e olhe lá! 

            Também não sei como escreveria uma redação com este título. Mãe é um ser difícil de definir. Danuza Leão, por exemplo, escreveu que uma mãe tem que ser confortável. E mãe confortável é aquela que tem vida própria: ou joga pôquer e ninguém vai tirá-la da rodinha de sábado, ou tem um namorado que não vai deixar, nem morta, para cuidar dos netos, ou tem um gato que não pode ficar sozinho. É claro que o filho vai reclamar que não conta com ela  para nada e vai acusá-la de ser egoísta. Mas, se ele pudesse escolher entre uma mãe que sufoca e a que vive e deixa viver, por certo escolheria a última. Aconselha a não dizer ao filho que gosta dele mais do que tudo neste mundo. E a não ficar triste ao constatar que ele se importa mais com seus próprios filhos do que com a mãe. Pois a vida é assim, e o amor de cima para baixo - de mãe para filho - é muito maior do que aquele de baixo para cima - de filho para mãe. O que é natural, não é bom nem ruim, nem justo nem injusto: apenas é.

            Por outro lado, se perguntarmos a filhos como definiriam uma mãe, poderíamos ouvir respostas bonitas como "mãe é muito mais que um parente, mãe é jeito de amar'; "mãe é ser ao mesmo tempo a pediatra, a cozinheira, a professora, a brincadeira, o abraço; ser mãe é ser mágica";  " ser mãe é um dom divino que Deus deu a cada mãe,  por falta de tempo de cuidar de todos nós, ele criou a mãe"

            Mas também poderíamos ouvir respostas como: "mãe é aquela que não tem tempo nem para comer,  mas não se esquece de perguntar: -"E os dentes, já escovou?";  "mãe é aquela que padece no paraíso e inferniza a vida dos filhos"; "mãe é tão chata que não deixa os filhos andarem desarrumados e em plena chatice dá um beijo no filho na frente dos colegas da escola". Ou então:  "mãe é uma espécie esquisita que se alterna entre fada e bruxa com uma naturalidade espantosa."

            Eu, particularmente, gostei de uma definição que encontrei: "ser mãe é descobrir que o príncipe encantado, o homem dos seus sonhos, nasceu de você". Não pela explicação em si, mas porque lembrou-me do meu netinho Breno, de sete anos. Dia desses, quando fazia pouco tempo que o Zé, meu marido, tinha falecido, o Breno e eu estávamos na cozinha picando tomates (ele é um bom ajudante). De repente, ele disse: -"Que pena,  vovó, o seu príncipe encantado morreu!" Fiquei surpresa, perguntei qual príncipe encantado e ele respondeu : " O vovô Zé! "  Completou que agora eu dormia sozinha, que eu devia estar triste e se eu queria que ele dormisse na cama comigo. Quase chorei de emoção. Respondi que não precisava, quando a gente é mãe e avó nunca está sozinha...

            Enfim, mãe é mesmo um ser estranho, que olha para a seu bebê  querendo que ele não cresça nunca, não engatinhe, pois isso não seria necessário, ela poderia carregá-lo no colo a vida inteira. Que passa por experiências aterrorizantes, como ter um bebê engasgado no seu ombro ou o filho partir para as drogas. Que passa por noites mal dormidas, que sofre junto com os filhos adolescentes, com os filhos adultos, com os filhos já velhos. Querendo que as dores deles sejam suas. Mas, maior que tudo, ser mãe é fazer parte de um milagre, o milagre da vida.  É saber que o nascimento de um filho anuncia um futuro vasto do qual  não fará parte totalmente, pois os filhos são uma forma  de irmos mais longe no nosso tempo aqui na Terra. Ser mãe é ter o desprendimento e a sabedoria de saber que os seus filhos não são seus , como na poesia de Kahlil Gibran: " seus filhos não são seus filhos, são os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma. Vêm através de você, mas não de você.  E embora vivam com você, eles não lhe pertencem.  Vocês são os arcos dos quais seus filhos são lançados como flechas vivas. Você pode abrigar seus corpos, mas não suas almas,  pois suas almas habitam na casa do amanhã, que você não pode visitar, nem mesmo em seus sonhos".

            Concluindo, parabéns para todas as mães: as carinhosas, as bravas, as chatas, as preocupadas demais, as desligadas, as tias-mães, as pai-mãe, as de barriga de aluguel, as adotivas, as que perderam seu filhos, as que cuidam de suas mães, as que estão no céu junto ao Criador. Porque mãe é mãe e ponto final.

 


 

 

 

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sábado, 24 de fevereiro de 2024

O ano 2100



                                             

                Fiquei pensativa ao ler  algumas reportagens  do jornal Folha de São Paulo, enfocando aquecimento global, avanços da Ciência, corrida à lua, inteligência artificial...Daí, fiquei pensando que tipo de mundo teremos no ano 2.100.

                Por exemplo, o físico Alexandre Araújo, doutor em Ciências Atmosféricas pela Universidade do Colorado, escreveu um extenso artigo sobre o aquecimento global e as ondas de calor que aconteceram no final de 2023. Tem um trecho assim: -"Você pode imaginar que num mundo 4 °C mais quente, vários pontos do Brasil chegariam a 50 °C. Nenhum dos nossos biomas resiste a isso. Nem a caatinga. Olha, está feio. É duro, porque a gente avisou tanto. Faz 20 anos que não faço outra coisa". Outro artigo, intitulado "Vêm aí os furacões força 6", de Marcelo Leite, jornalista de ciência e ambiente, alerta que os superfuracões serão cada vez mais frequentes e devastadores, pois a força deles está diretamente relacionada com a temperatura na superfície do mar, o seu combustível.  E Hélio Schwartsman, cronista , comentando a obra "The  Earth Transformed", descreve o fenômeno " El Niño" e  como o clima sempre foi personagem central da história humana. Afirma que dinâmicas ecológicas já extinguiram vários grupos e civilizações. Só sobraram os que souberam adaptar-se... E  teremos muito trabalho nas próximas décadas.

                Já o artigo "Saúde muda projeção e diz que país pode ter 4,2 milhões de casos da doença" ,  alerta que podemos ter quase três vezes mais casos de dengue em 2024 do que em 2023. As altas temperaturas têm contribuído para a proliferação do mosquito e também as chuvas torrenciais que causam alagamentos (é importante lembrar que uma única tampinha de refrigerante com água é um ótimo criadouro para a fêmea).

                Além de textos,  há imagens impressionantes nesse jornal. Uma do rio Solimões, seco e com enormes bancos de areia devido à seca histórica que aconteceu no Amazonas no final de 2023, é de cortar o coração. Na legenda, explica-se que a crise hídrica é fruto do descaso com a natureza e o planeta.

                Com tudo isso acontecendo, tem gente  que não quer ter filhos . Michael Kepp, jornalista ambiental norte-americano radicado no Brasil, escreveu "Procriar num planeta a caminho do colapso?" Explica que um bebê nascido hoje, quando já tiver envelhecido, em 2100, estará em um mundo onde o derretimento do gelo polar e glacial terá causado a subida do nível dos oceanos, que inundarão cidades costeiras; e o aquecimento global terá transformado grande parte do mundo em  deserto, reduzindo o abastecimento de alimentos e água, conforme alertam os cientistas do clima. Ou seja, os que nascerem hoje poderão sofrer muito. Ele, o Michael , afirma que não quer ter filhos, a criança poderia perguntar:-"Pai, já que não pedi pra nascer e você sabia que este mundo se tornaria cada vez mais inabitável, por que me colocou neste planeta infernal?"

                Concordo que teremos que nos adaptar e que teremos muito trabalho pela frente. Como disse Charles Darwin, "não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas sim o que melhor se adapta". Para isso, trabalhos de conscientização serão fundamentais,   desde atitudes individuais como apagar as luzes e tomar banhos menos demorados, até políticas globais  para salvar o planeta. E ao lado disso, o progresso da Ciência será imprescindível .  Como no artigo  "Indonésia tem desafio de cortar carvão." O país, um dos mais populosos do mundo,  é o terceiro maior produtor mundial de carvão e abriga uma das maiores florestas tropicais do planeta. Os três candidatos à presidência na próxima eleição mencionam explicitamente a necessidade de eliminação progressiva do carvão, para preservar as florestas. Precisam da Ciência para saber como fazer a transição energética e ao mesmo tempo salvar a floresta. Outro artigo,  "Usina solar flutuante em SP deve por país entre gigantes", aborda a construção de usina fotovoltaica  na represa Billings, demonstrando a busca  de métodos mais eficientes na geração de energia limpa.

                Felizmente, ao mesmo tempo que espécies entram na lista de extinção, há cientistas, estudiosos e ambientalistas  fazendo o que podem para salvar muitas delas. Por exemplo, no artigo "Em saga por coral de proveta, lua nova vira hora de caça a sêmen". O autor descreve o trabalho árduo da equipe de cientistas para coletar óvulos e espermatozoides do coral Mussismilia harttii,  ameaçado de extinção, que se reproduz nas noites de lua nova apenas de setembro a novembro. Realizam a fecundação "in vitro" e já criaram o primeiro banco de sêmen de corais. Enquanto isso, outros se debruçam nos animais do passado para entender os animais do presente. No artigo "Pele fossilizada com 290 milhões de anos é encontrada nos EUA" , descreve-se que foi encontrado um fragmento de pele fossilizado menor que uma unha dos dedos da mão. Além de conseguirem datar esse fóssil, os paleontólogos consideraram que é uma pele típica de jacarés e crocodilos.  E que tudo indica que foi a partir de estruturas como as encontradas nessa pele fossilizada,  que a evolução trabalhou para produzir as demais estruturas da epiderme dos vertebrados, como o pêlo dos mamíferos e penas das aves.

                Bem, com tanto avanço na Ciência e com tantos países estabelecendo metas para reduzir o aquecimento global, talvez nem tudo esteja perdido.  E se tudo der errado, que Deus proteja os terráqueos em 2.100. Que, aliás, em 2100, poderão ter se transformado em lunáticos. Conforme o artigo "Corrida à lua e Starship marcam ano espacial", uma intensa corrida pela Lua e uma temporada dedicada aos asteroides marcaram 2023 na exploração espacial. O veículo Starship, da SpaceX, empresa de Elon Musk, foi escolhido pela NASA para levar tripulações à superfície da lua. Ainda há muito o que fazer, mas penso que até 2100  estarão circulando como ônibus...

                 E se não der certo na Lua, no artigo "Lua de Saturno abriga oceano propício ao surgimento de Vida", relata-se que Mimas, uma pequena lua de Saturno, possui água líquida abaixo da sua camada de gelo. Os astrônomos concluíram que Mimas reúne todas as condições para a habitabilidade. Assim, podemos ir para lá também. Aliás, eu não! Em 2100 estarei debaixo da terra. Ou no céu, não sei.