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terça-feira, 19 de novembro de 2024

Brazilian thong


                                                           BRAZILIAN THONG

 

                 Desapegar de alguns objetos pode ser um problema enorme. Ou pelas lembranças boas que eles trazem, ou por não saber como e onde descartar, ou por preguiça e comodismo, ou por pensar que podemos achar outro uso para eles. E até mesmo por nostalgia, pois podem ser uma fonte de consolo e de conforto em tempos de saudades , como penso que foi o caso da minha mãe. Velhinha, sentada no banco do quintal, certo dia separava algumas tranqueiras de uma gaveta. Encontrou uma caixinha branca, sacudiu, abriu e me perguntou: -"Sabe o que tem aqui?" Na hora, por intuição e conhecendo como ela gostava de guardar coisas velhas, respondi: "- Deve ser o meu umbigo, sequinho!" Jesus, e era! Ficamos as duas boquiabertas, ela por eu ter adivinhado e eu por ela ter guardado meu umbigo por mais de 50 anos! Enterrei-o no canteiro do jardim e encerrei o assunto.

                Mas ás vezes guardar e usar coisas velhas pode causar complicações. Como na caso de minha filha. Em uma de suas andanças como mochileira pelo mundo, com uma amiga, foi da Índia para o norte da Tailândia, para um vilarejo bucólico com piscinas termais. Hospedou-se em uma pousada, num chalé entre árvores, mais afastado. A dona do chalé, uma tailandesa pequenina, avisou-a que  tinha aparecido por ali um ladrão de calcinhas. Explicou que minha filha não precisava se preocupar, pois ela já havia preparado uma armadilha para pegar o larápio sem-vergonha: iria dependurar várias calcinhas novas e coloridas no varal e ficar de tocaia. Assim, depois do banho, minha filha, tranquila,  lavou e dependurou na varandinha do chalé a calcinha velha, com a rendinha rasgada, elástico relaxado e vários buraquinhos na malha. Pensou que estava na hora de jogá-la fora, mas como ainda teria alguns dias de viagem e na Tailândia só se encontra calçolas esquisitas pra comprar, resolveu conservá-la por mais um tempo, jamais encontraria uma calcinha confortável como as brasileiras. Dormiu com os anjos e no dia seguinte, quando olhou no varal, a calcinha tinha desaparecido! E ao longe avistou o varal da tailandesa com as calcinhas novas e coloridas tremulando ao vento, intactas.  Dias depois, a tailandesa avisou que a policia local tinha desconfiado de um turista japonês que estava hospedado lá por perto. Deram uma batida na casa dele e encontraram calcinhas de todo tipo. Assim, estavam precisando de testemunhas para reconhecer as calcinhas e a minha filha precisava ir até a delegacia reconhecer a dela. Horrorizada, minha filha disse que jamais iria até lá reconhecer a calcinha velha, tinha vergonha. Mas a tailandesa tanto insistiu que ela foi. O policial pequenino (lá todos são pequeninos) espalhou várias calcinhas sobre a mesa, ela reconheceu a calcinha esburacada, ele a colocou em um saquinho de plástico, escreveu em letras garrafais "BRAZILIAN THONG" e a guardou como prova do crime. Deve estar por lá ainda, na forma de pó. E o japonês, não se sabe o paradeiro.

                Ah, e tem também um caso local, da camisola da minha amiga. Foi assim: há alguns anos , em Uberlândia, no centro, aconteceu  a explosão de um botijão de gás durante a noite. Um acidente terrível, que danificou prédios e lojas. A minha amiga morava em um prédio próximo . Quando ouviu o estrondo da explosão, pensou que era um avião que tinha caído em cima do prédio. Levantou-se como estava, com uma camisola confortável, mas com fendas laterais,  bem velha, feia, desbotada e descosturada  nas laterais. Desceu esbaforida todos os degraus, do décimo segundo andar até o térreo, sem chinelos, sem óculos, sem nada, só de camisola velha. Todos os moradores do prédio desceram também como estavam. Quando o dia amanheceu, ficaram olhando uns para os outros, consternados, e ela encolhida na sua camisola desbotada e descosturada. Jurou que , a partir daquele dia, só dormiria com camisolas lindas e novas, pronta para qualquer explosão de botijão de gás, queda de avião ou terremoto.

                Bem, depois do umbigo, da calcinha velha e da camisola com fendas, não resta mais nada a contar.


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