Gosto de
estátuas de bronze, dessas sentadas em um banquinho, onde se pode sentar,
abraçar a estátua, sorrir e tirar uma foto. E ás vezes, conversar com ela.
No Rio
tem uma assim, do poeta Drummond, na Avenida Atlântica. Ele passa o dia com
pessoas sentadas ao seu lado, tirando fotos e tentando arrancar seus óculos.
Ruy Castro, colunista da Folha de São Paulo, na crônica “Papo com a estátua”,
conta que observou duas pessoas com uma relação especial com essa estátua. O
primeiro sujeito chega bem cedo e bate profundos papos com o poeta. Não se sabe
o que fala, mas deve ser importante, porque dá para vê-lo gesticulando ou se
inclinado sobre Drummond, como que para ouvi-lo melhor. Lógico, se ele fala com
Drummond, porque Drummond não falaria com ele? Já o outro amigão do poeta chega
ao anoitecer, quando está esfriando. Tira o casaco ou o que for e joga sobre os
ombros de Drummond, para agasalhá-lo. Quando chove, abre um guarda-chuva e
protege o poeta. E deve sofrer quando chove em outras horas e não pode
cobri-lo.
Aqui em
Uberlândia não tem uma estátua assim, que inspire conversas ou cuidados.
Poderia ter talvez uma do Rondon Pacheco, sentadinho num banco na Tubal Vilela.
Ele é uma pessoa simpática, eu iria conversar com ele. Mas só tem uma cabeçorra
do Juscelino Kubitschek, muito sisudo, olhando fixamente pra frente, não dá nem
pra tirar fotos sorrindo ao seu lado.
Felizmente,
em minhas andanças pelo mundo, encontrei duas estátuas de bronze que inspiravam
aconchego. A primeira, em Boston, de um senhor simpático, de meia idade,
feições fortes, com terno e gravata amassados, segurando dois tubinhos, sentado
em um banco comprido onde havia uma bola de basquete embaixo. Não sei quem era,
mas causava simpatia e curiosidade. Tirei uma foto sorridente sentada ao seu
lado, de braços dados com ele e com o meu filho que morava em Boston.
A outra
estátua, uma das mais famosas de Portugal, encontrei em Lisboa, na região do
Chiado, na conhecida cafeteria “A Brasileira”. Lá estava, não em carne e osso,
mas em bronze, o poeta português Fernando Pessoa, que foi freqüentador assíduo
desse café. Ele tinha um semblante tranqüilo, um pouco sério, magro, com as
pernas cruzadas, de terno apertado e gravata borboleta, chapéu tipo Panamá, de
bigodinho, óculos redondos e pequenos, sentadinho em uma mesa onde apoiava uma
das mãos. Dezenas de pessoas vão diariamente ao local, tirar fotos com ele:
fazem poses enlaçando seu pescoço frio, sentadas na cadeira ao seu lado,
pegando em sua mão, olhando para o poeta intrigados ou com admiração. E ele
ali, impassível, curtindo a movimentação em torno da sua pessoa de bronze.
Tirei uma foto abraçada com ele, feliz de
documentar para a posteridade a minha presença ao lado de um poeta capaz de
escrever versos tão singelos como:” eu tenho um colar de pérolas, enfiado para
te dar: as pérolas são os meus beijos, o fio é o meu penar”. Ou então: “Tens
uns brincos sem valia, e um lenço que não é nada, mas quem dera ter o dia, de
quem és a madrugada”. E outros profundos como: “não sei quantas almas tenho,
cada momento mudei; continuamente me estranho, nunca me vi nem acabei. De tanto
ser, só tenho alma. Quem tem alma não tem calma, quem vê é só o que vê, quem
sente não é o que é.”
Pois é, Fernando, se eu morasse
em Lisboa, iria sempre conversar com você, tiraria meu casaco para protegê-lo
do frio e abriria o guarda-chuvas quando chovesse.