A cada dois dias tentarei colocar um texto novo, para manter o interesse dos meus leitores e também algumas fotos para exemplificar alguns textos. Obrigada pelo apoio.

sexta-feira, 18 de maio de 2018

Retalhos da Infância

Lia escrevendo sobre a fadinha do dente

Uma das obras de arte da Lia


As quatro mães e alguns filhos, a Maíra no meio


           Como escreveu Cora Coralina, nós somos feitos de retalhos, de pedaços coloridos de cada vida que passa pela nossa e que a gente vai costurando na alma. Nem sempre são felizes, nem sempre são bonitos, mas sempre acrescentam e fazem a gente ser como a gente é. Em cada retalho, uma lição, um carinho, uma saudade, uma lembrança que nos torna mais pessoas, mais humanos, mais completos. E de retalho em retalho nos tornamos um imenso bordado de nós mesmos.
          Na minha colcha de retalhos, os que mais gosto são os acrescentados pelas crianças da minha vida. São retalhos bem coloridos, divertidos, originais. Por exemplo, um retalho recente acrescentado pela Lia, minha netinha de sete anos que mora nos States. Ela é uma  artista, faz desenhos e artes incríveis, combina as roupas como uma estilista, faz cartões lindos todo dia para o pai, enfeita a casa com  bilhetes coloridos, faz toucas e cachecóis de crochê, uma graça. Mas acontece que agora ela perdeu seu primeiro dentinho de leite. No começo, com o dente bem mole, estava entusiasmada esperando a chegada da fadinha do dente que iria pegar o dentinho debaixo do travesseiro e trocar por uma nota de cinco dólares. No entanto, quando a fadinha chegou na calada da noite e fez isso mesmo, caiu em prantos . Queria o dentinho de volta para guardar para sempre. Daí, tentou cativar a fadinha e fez um tipo de altar pra ela, com flores, guloseimas, bugigangas e escreveu uma cartinha (com alguns errinhos de inglês) pedindo o dentinho de volta. A fadinha aceitou.
           Depois, foi a confusão do terrário.  Tudo começou quando estive lá e construímos a três (ela, o irmão Enzo e eu) um terrário fechado  para observar aranhas, minhocas, insetos, a formação da chuva, as plantinhas crescendo. Adoravam coletar os animais e colocar dentro, mas a Lia ficou com pena das minhocas, remexeu a terra e soltou todas. Antes, fez uma casinha de folhas e barro para elas. O Enzo ficou indignado. O problema piorou no dia em que foram ao parque e encontraram um besouro bonito, grande, preto luzidio. O pai teve que carregar o besouro na mão por vários quarteirões. A Lia não quis colocar o inseto dentro do terrário, preferiu montar um local  para ele, decorado com pedrinhas, flores e grama. O Enzo ficou bravo novamente. A mãe foi apaziguar a briga e dar uma olhada no besouro, todo confortável no seu recanto florido. E, surpresa, na verdade era uma barata, e das grandes! Foi a vez dela ficar brava e indignada com o marido, que nem conhecia uma barata e levou uma pra dentro de casa. Ele ficou com nojo de ter carregado a barata na mão. A Lia caiu em prantos novamente porque não queria que matassem a barata. Ânimos acalmados, optaram por soltar a barata no parque onde a haviam encontrado.
       A minha outra netinha de sete anos, Maíra, também é uma graça e sempre acrescenta retalhos coloridos na minha colcha. No almoço do último dia das mães, estávamos quatro mães reunidas para tirar a foto clássica, quando ela chegou rápido e  se posicionou bem na frente do grupo para sair na foto. A turma mandou ela sair, pois  não era mãe . Ela respondeu que era futura mãe e não arredou pé, foi a mais sorridente do grupo.
       E tem também as crianças dos vizinhos, dos parentes, dos amigos. São muitos retalhos coloridos. Lembro-me de uma vizinha que tinha quatro meninos. Um deles era meu amiguinho inseparável. Um dia, a filha pequena de uma amiga da vizinha estava tomando banho no chuveiro . Ele ficou olhando escondido a menina peladinha. A mãe o pegou no flagra e disse: "Mas que coisa feia!"  E ele, com os olhinhos brilhando: "Não é feio não, mamãe, é só um rachadinho assim..." E fez um sinal vertical com a mãozinha, de cima pra baixo.
            Enfim, parafraseando a poetisa, é assim mesmo que a vida se faz, de pedaços de outras gentes que vão se tornando parte da gente também. E nunca estaremos prontos e acabados, pois sempre haverá um retalho novo para se adicionar à alma.


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