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quinta-feira, 11 de junho de 2015

No ônibus


Maíra e a cobra
          "Educação, boa e velha" é o nome de um texto da psicóloga Rosely Sayão.  A autora comenta que na sociedade atual os velhos perderam importância e que os pais das crianças não acreditam que os avós tenham algo a acrescentar à formação dos netos . Mas os avós insistem, porque acham que vale a pena ensinar aos netos coisas como  certo e errado, falso e verdadeiro e que ter liberdade é muita responsabilidade. Rosely acrescenta que antes, os avós mimavam os netos, mas que agora não podem mais fazer isso, pois são os pais é que mimam, satisfazendo todas as vontades dos filhos. Daí, muitos avós da atualidade conseguiram inovar o sentido da palavra "mimar". Para esses velhos, mimar passou a ser dedicar tempo aos netos e ter paciência com eles (penso que estou nesse grupo). A isso, eu acrescentaria que mimar também é aprender com os netos e se divertir com eles.
       Como num dia desses, quando realizei o sonho da Maíra, minha netinha de quatro anos. O sonho dela era passear de ônibus. Assim, decidi levá-la ao Campus Umuarama, onde eu trabalhava, e fomos para a praça Tubal Vilela. Depois de esperarmos 20 min, ela entrou no ônibus animadíssima, conversando com os passageiros e de olho na janela. Ficou preocupada com uma moça de pé ao lado de um assento vazio e falou várias vezes: "-Moça, senta aí", mas a moça não sentou. Quando chegamos ao campus, uma amiga minha, professora de répteis, levou a Maíra para conhecer o serpentário e deixou que ela passasse a mão em uma cobra inofensiva. Ela ficou fascinada. Na volta, pegamos o ônibus no ponto mais perto. Assim que a porta abriu e a Maíra subiu os degraus, parou no meio do corredor, antes da roleta, colocou as mãos em volta da boca e gritou a plenos pulmões, com seu vozeirão característico:"-Geeeente! Geeeente! Eu passei a mão na cobra!". Alguns passageiros riram, outros devem ter pensado que ela estava mentindo, outros  continuaram dormindo. Eu, meio sem jeito, tentei explicar alguma coisa. Mas logo o ônibus deu um safanão e consegui segurar a Maíra pela gola da blusa. Na sequência, no afã de pegar rápido um lugar com janela, ela entalou debaixo da roleta, tentando passar por baixo. Pegamos o ônibus errado e tivemos que parar no terminal para pegar outro, que estava lotado. Consegui um assento e a coloquei no colo, mas ela ficou indignada porque tinha uma moça sentada ao lado, na janela, e a Maíra tinha certeza que o lugar deveria ser para ela. No dia seguinte, fomos ao bairro Guarani, na casa da minha ajudante, e para ela foi outra aventura. Voltou de cabelo lavado e escovado e de unhas pintadas. Minha ajudante tem um salão de beleza e a Maíra usufruiu de tudo. Entrou linda no ônibus, sentamos nos assentos da frente e ela contou toda a sua curta vidinha de quatro anos para o motorista, sempre com um olho nele e outro na janela. Não falou da cobra, mas ao descer falou bem alto: "-Brigaaaaado, motorista"!
       Acho as crianças incríveis e por isso ainda pretendo mimar muito meus onze netos. Como escreveu Adélia Prado: "Meu Deus, me dá cinco anos, me dá a mão, me cura de ser grande..." Ou como no texto de Rubem Alves: "são as crianças que veem as coisas -porque elas as veem sempre pela primeira vez com espanto, com assombro de que elas sejam do jeito como são. Os adultos, de tanto vê-las, já não as veem mais. As coisas -as mais maravilhosas- ficam banais. Ser adulto é ser cego."

        Penso que a Maíra viu muita coisa pela janela do ônibus que eu não vi...

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