Meu irmão, minha sobrinha e eu, de cachinhos, no jardim da minha infância
No excelente filme "Perfume
de mulher", Al Pacino representa um
militar cego que sonha em passar um fim de semana inesquecível em Nova York
antes de morrer. A cena mais bonita do filme é um tango que ele dança com uma
jovem, ao som da música de Carlos Gardel. Mas o interessante é a extrema
sensibilidade do militar, como pessoa cega, em sentir e definir com precisão o perfume
usado por cada mulher que se aproxima dele.
Pensei
então que existem perfumes que nos fazem lembrar de certas pessoas ou de
lugares. O perfume da flor de magnólia sempre me lembra a minha mãe e o jardim da minha infância. Na nossa antiga
casa, numa cidadezinha de interior, existia um belo jardim com hortências,
rosas, antúrios, ciprestes e palmeiras. No meio, majestoso em sua simplicidade,
um pé de magnólia. Quando as flores brancas se abriam, perfumavam todo o
ambiente, com um aroma adocicado e penetrante. Minha mãe cuidava do jardim e
tinha um carinho especial pelo pé de magnólia: podava, tirava as flores e
folhas velhas, colocava terra e esterco. E quando sinto cheiro de goiaba também
me lembro dela. Todo ano fazíamos goiabada. Eram dias de labuta e minha mãe
ficava com cheiro de goiaba. E eu também, pois ajudava em todas as etapas,
desde subir no pé para apanhar as goiabas, até ficar horas mexendo o tacho de
cobre na trempe de lenha, com uma grande colher de pau, com medo do doce de
goiaba molinho e escaldante, que borbulhava no tacho, cair nas minhas pernas. Sinto
saudades dela. Mãe é para sempre e não deveria morrer. Como escreveu Drumond : "-Por que Deus permite que as
mães vão-se embora? Fosse eu Rei do Mundo, baixava uma lei: mãe não morre
nunca, mãe ficará sempre junto de seu filho e ele, velho embora, será sempre
pequenino feito grão de milho".
Mas
não tem como e um dia as mães vão-se embora. Mas deixam seus ensinamentos, exemplos e a lembrança de algum perfume só
seu. E com certeza, se amor tivesse perfume, todas as mães teriam o perfume do
amor. Um perfume resultante do amor de
todos os tipos de mãe: a mãe de
barriga ou a mãe de vida; a mãe alegria e a mãe sofredora; a mãe educadora e a
mãe analfabeta; a mãe corajosa, a mãe oprimida, a mãe carinhosa, a mãe-pai , a
mãe desde sempre e a mãe escolhida; a mãe que se acaba junto com o filho
viciado, a mãe que pede pão para os filhos. E tantos outros, pois os tipos mudam, mas o amor não.
Como
exemplo de tipo de mãe dos tempos modernos, temos a mãe de aluguel, que surgiu com o aperfeiçoamento das técnicas
de reprodução humana. Li na "Folha" (28/04/15) uma reportagem sobre o
terremoto no Nepal, enfocando o resgate pelo governo de Israel de 26 bebês
recém-nascidos de barriga de aluguel.
São filhos de solteiros e gays israelenses que utilizaram a inseminação
artificial e o embrião foi implantado no útero da mãe de aluguel. Há mais de
100 mulheres nepalesas grávidas de filhos de israelenses; o processo custa em
torno de US$20 mil no Nepal e US$ 100 mil nos EUA. Com medo de tremores
secundários, estão resgatando os bebês e 20 mães de aluguel em adiantado estado
de gestação, mas não há preocupação com
as 80 mães que ficarão e nem com aquelas
que acabaram de dar a luz.
Ser
mãe de aluguel é um assunto complexo demais para dar opinião. Só sei que minha
mãe nunca sonharia que isso seria possível e não entenderia nada do processo, mas mesmo assim envolveria todas as
mãe com seu perfume de magnólia.
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