Cada fase da vida tem suas características e umas são melhores, outras piores. Uma das
fases difíceis é quando começamos a "caducar". E não há como fugir
disso, pois a vida é um ciclo, que vai de babando a caducando...
Tenho um conhecido que está nessa fase e as conversas dele
são uma loucura. Sempre que nos encontramos, batemos longos papos e damos boas
risadas. Ele gosta de contar que tem treze formaturas e que fala fluentemente
quatro línguas: inglês, francês, china e bagdá. E que agora está aprendendo os
pauzinhos do iraque. Conta que trabalha para a NASA e que tem livre acesso à
base militar montada em Anápolis. Acrescenta que sabe dirigir qualquer tipo de
caminhão e que pilota avião a jato. Disse que está comprando um trailler de
três andares para viajar pelo mundo com minha filha, pois sabe que ela gosta
muito de viajar e vai levá-la para conhecer Cancun. Eu comecei a rir e falei
que é muito longe para ir de trailler. Ele então disse que vai de avião a jato
e chega lá em cinco minutos. E que também vai levá-la na Avenida Paulista para
ela comprar centenas de camisas lindas e baratas e revendê-las a cinco reais
cada. Conta que é dono de vários prédios na Avenida Paulista, que ganhou de
herança do avô. Completa a conversa dizendo que conhece muita gente importante
e que arranjou emprego no Palácio da Justiça para uma moça de Morrinhos. Rindo,
conta que ela é muito burra, mas que conseguiu um salário de dezoito mil reais para
ela.
E por aí vai. Fico imaginando como deve ser a mente de uma
pessoa com o Mal de Alzheimer e o sofrimento pelo qual toda família passa.
Qualquer um de nós pode passar por isso, é só uma questão de tempo. Eu mesma já
ando misturando tudo. Chamo o cachorro pelo nome do filho e o filho pelo nome
do cachorro. Esqueço as panelas no fogo, o ferro ligado e queimo tudo. Estou
ficando perigosa. Falta pouco para pensar que também trabalho na NASA.
Em outra fase, estão as crianças. Num mesmo dia, encarnam o Batman,
o Super Homem, o Homem Aranha. Colocam uma capinha e pulam de lugares altos,
pensando que podem voar (muitos se estatelam no chão). Entre uma coisa e outra,
têm conversas muito lúcidas. Como o meu neto de seis anos, quando estávamos conversando
sobre vacas e porcos. De repente, ele soltou a seguinte generalização: "todas
as vacas são fêmeas". E o outro, muito briguento, quando comentei que eu
estava feliz porque ele tinha melhorado o comportamento, olhou-me bem nos olhos
e disse com seriedade: "é, as coisas mudam!"
Entre a fase dos idosos e das crianças, estão adultos bem
loucos, gritando conversas escandalosas ao celular, nos locais menos
apropriados. Como a mulher que ouvi na sala de espera do aeroporto, bem alto: "o
que? Mas já, na lua de mel?" Pausa. Todos por perto olhando para o alto,
fingindo não escutarem. "E agora, você ainda vai ficar com esse canalha?
" Pausa. Mistério.
Tem também a conversa que ouvi na padaria, de outra mulher
(será que as mulheres são fofoqueiras?). Ela repetiu bem alto, várias vezes,
pois parece que a pessoa do outro lado era um pouco surda: "a Ritinha
entrou hoje na justiça, quer a metade da casa. Descobriu que foi
"chifrada" durante estes anos todos". Puxa, será que todo mundo precisa saber que a
Ritinha foi chifrada?
Bem que diz o ditado: "de médico e de louco, todo mundo
tem um pouco"